quinta-feira, 5 de abril de 2007

Batucada primata


No Piauí, estudo feito com grupos de macacos-prego que batem pedras para intimidar predadores reforça evidências da transmissão cultural em primatas. Resultados foram publicados em revista suíça de primatologia (foto: divulgação)

Fábio de Castro

Agência FAPESP – A observação de um grupo de macacos-prego (Cebus apella libidinosus) batendo pedras com a possível finalidade de afugentar predadores representa mais uma evidência de que, assim como os humanos, os macacos são capazes de transmitir tradições culturais.

O estudo, realizado no Departamento de Sistemática e Ecologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), por Antonio Christian de Moura, pesquisador do Laboratório Tropical de Primatologia da instituição, foi publicado em fevereiro na revista suíça Folia Primatologica, um dos principais periódicos do mundo na área.

De acordo com Moura, diversos estudos anteriores constataram a capacidade de transmissão cultural de determinados grupos de macacos. Desde 2001, sabe-se que os macacos-prego utilizam pedras como ferramentas para quebrar castanhas e outros objetos. Mas é a primeira vez que tais animais são observados realizando uma “sinfonia” de golpes com as pedras.

O grupo de macacos foi observado no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí. “Quando eu me aproximava, os macacos procuravam pedras e começavam a bater com elas em rochas, repetidamente. Aparentemente, era um ato agressivo, dirigido a mim como um predador potencial. Quando eles se acostumavam com a minha presença, as batidas diminuíam”, disse Moura à Agência FAPESP.

Segundo o cientista, a espécie é a única em que foi observado o comportamento. “Bater objetos em superfícies parece ser uma característica inata, mas que pode ser moldada em comportamentos sociais para novas funções. Ao bater a pedra, o ruído viaja a uma distância bem maior que um grito, tornando-se um alarme eficiente”, afirmou.

Nas observações feitas anteriormente, a batucada só havia se manifestado pelos macacos para vasculhar ou quebrar alimentos, principalmente em grupos em cativeiro. “Desta vez foi constatado em um grupo selvagem. A falta do dispositivo em outras populações da mesma espécie, que têm acesso a pedras, sugere que bater pedras possa ser uma tradição social da população estudada”, disse.

Resposta social

Para Moura, os primatas reagem freqüentemente a posíveis predadores utilizando dispositivos de intimidação, mas a elaboração desses dispositivos depende do risco. “Estudos de origem evolutiva sugerem que a cultura teria um benefício muito maior em áreas nas quais o ambiente é hostil”, disse.

A capacidade de responder a diferentes predadores pode ser adquirida socialmente e as tradições sociais explicariam, de acordo com Moura, diferenças entre populações em respostas aos mesmos predadores potenciais. “Esse dispositivo foi observado em seis grupos diferentes e a hipótese mais plausível é que sua função primária seja a de um comportamento de dissuasão de predadores”, afirmou.

Em poucos casos, macacos adultos e filhotes foram vistos batendo pedras juntos, sem prestar atenção ao pesquisador, sugerindo que os mais jovens aprendiam a técnica com os mais experientes. “Macacos cativos inseridos na área do grupo estudado também, aparentemente, aprenderam a bater as pedras com os outros”, disse o pesquisador.


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