Cláudia Zucare Boscoli
Na animação Madagascar, da Dreamworks, uma zebra do zoológico de Nova York convence seus colegas leão, hipopótamo e girafa que a vida em cativeiro é enfadonha e que a verdadeira felicidade está na selva. Fogem e, depois de muitos percalços até a ilha africana que dá nome ao filme, encaram a dura realidade: eles não sabem mais brigar pela própria comida, nem se defender dos predadores. A conclusão, a la O Mágico de Oz, é que o melhor lugar do mundo é aquele em que se aprendeu a viver. Na vida real, o tema é delicado. Profissionais dos zoológicos e defensores dos direitos dos animais de todo o mundo vêm travando discussões sobre a necessidade da manutenção de animais em cativeiro. E como não se pode contar com a opinião dos principais interessados, a polêmica prossegue.
Diretores de zoológicos dos EUA, por exemplo, estudam a viabilidade de pôr fim à exibição de animais de grande porte, principalmente ursos e elefantes. A justificativa é mais do que válida: esses bichos têm demonstrado grande variação de comportamento, em alguns casos até neuroses, e problemas físicos, como artrite, decorrentes da falta de espaço nos cativeiros. Por aqui, Ibama e sociedades de zoológicos têm uma convicção: o cativeiro é necessário. Não para poder mostrar animais silvestres às crianças como muitos acreditam.
Apesar de ser cobrado de todos os zôos que desenvolvam atividades de educação ambiental, há outras duas razões de maior urgência para os próprios animais. A primeira delas diz respeito à pesquisa, que garante a reprodução em cativeiroe a conseqüente manutenção da espécie. “Até uns anos atrás, quase não haviamais micos-leões-dourados no Rio de Janeiro. Graças ao trabalho dos zoológicos, eles voltaram. Foi feita a reprodução em cativeiro e, pouco a pouco, eles foram reintegrados à natureza. O pessoal os treinou a buscar comida, a se defender”, exemplifica o coordenador geral de fauna do Ibama, Ricardo Soavinski. O diretor técnico científico do Parque Zoológico de São Paulo, José Luiz Catão Dias cita também o caso dos gorilas provenientes da África equatorial. “Lá, eles estão em constante ameaça, por conta da caça, de doenças transmitidas pelo ecoturismo, pela devastação que diminui seu habitat. O que garantiria a continuação da espécie se não a reprodução em cativeiro? Os zoológicos sobrevivem, sem dúvida, sem gorilas, tanto que só há um em todo o Brasil que mantém esses animais em exposição. Mas será que os gorilas sobreviveriam sem a pesquisa desenvolvida nos zoológicos?”, questiona.
O segundo ponto levantado por quem defende a manutenção dos animais em cativeiro é, justamente, a dificuldade para eles se reintegrarem à natureza. Além de desaprenderem a se virar na mata, ao sair de seu habitat, eles passam a carregar bactérias, protozoários e vírus que, se levados aos demais animais dessa e de outras espécies, podem causar verdadeiros desastres ecológicos. Legalmente, é proibido retirar animais da natureza, seja para a exibição em zoológicos ou qualquer outro fim. No entanto, há os animais que estão nos zôos desde antes da promulgação da lei, e que não se readaptariam, e também os provenientes do tráfico. “O ideal seria mesmo que os animais nunca saíssem do seu habitat”, confessa Catão. “Mas há uma retirada absurda de bichos da natureza e isso quem faz não são os zoológicos. Os que podem ser repatriados são, mas muitos não podem e a própria União Internacional para a Conservação da Natureza (órgão da ONU) recomenda que sejam mantidos em cativeiro”, explica. Algumas estatísticas falam de 12 milhões de animais silvestres capturados pelo tráfico anualmente. Outras calculam que passe dos 38 milhões.
Contrária à existência de zoológicos, Ila Franco, presidente da União Internacional do Animal (Aila), duvida da função educativa dos mesmos. “O homem mantém o animal em cativeiro como fazia com os escravos. Diz que ele não tem alma, então pode acorrentar, pôr em jaula. As crianças aprendem uma coisa que não é verdade, porque não é assim que eles vivem”, condena. No entanto, ela considera aceitável a iniciativa de manter nos zôos os animais que não podem ser repatriados. “Mas tem que atender às necessidades do bicho. Os elefantes, por exemplo, caminham 30 km por dia na natureza e usam a lama para proteger a pele dos insetos. Se forem construídos santuários que ofereçam isso a eles, aí sim, se estará realmente pensando no bem-estar animal”, conclui.
Condições mínimas
Fonte: Revista Isto é
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