Fábio de Castro
O Instituto Butantan inaugurou nesta quinta-feira (26/4), em São Paulo, a primeira fábrica de vacinas contra o vírus influenza, causador da gripe, na América Latina. Com 10 mil metros quadrados ocupados por equipamentos de alta tecnologia, a planta terá capacidade anual de produção de até 40 milhões de doses de vacina.
O investimento de R$ 68 milhões foi feito pelo Ministério da Saúde e pelo governo paulista. Desde 1999, o Brasil comprava da França o concentrado necessário para a formulação da vacina, com custos anuais de cerca de US$ 100 milhões. Na época, o Instituto Butantan e a Fundação Butantan fizeram um acordo de transferência de tecnologia com a empresa farmacêutica francesa Sanofi Pasteur, concluído agora. Durante a inauguração, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo também anunciou a construção, até 2009, de duas novas fábricas: uma de hemoderivados e uma para a produção de uma vacina brasileira contra o rotavírus. Ambas serão instaladas no Instituto Butantan e terão investimentos estimados em R$ 60 milhões. De acordo com Isaias Raw, diretor do Instituto Butantan, a vacina contra a gripe produzida na nova fábrica será entregue ao Ministério da Saúde, que a redistribuirá aos estados gratuitamente. Cada estado arcará com os custos de inoculação. “É o mesmo processo que ocorre com outras vacinas que produzimos e que correspondem a 82% das feitas no país. Com a nova fábrica, o Butantan suprirá completamente a demanda de vacinas usadas na campanha nacional dos idosos a partir de 2008”, disse Raw à Agência FAPESP.
Atualmente, as 20 milhões de doses utilizadas na imunização gratuita de maiores de 60 anos e outros grupos de risco são inicialmente produzidas na França. O Instituto Butantan faz a formulação dos três tipos diferentes de vírus, o envasamento e o controle de qualidade da vacina. Segundo Raw, a nova fábrica representa um passo inédito para a indústria nacional, uma vez que grande parte dos equipamentos utilizados – como tanques, reatores e outros produtos específicos em diferentes etapas de produção – foram desenvolvidos com mão-de-obra local, gerando conhecimento, inovação e desenvolvimento tecnológico. “Trata-se de um dos maiores empreendimentos que o Butantan já fez, pelo tamanho da fábrica e pela sua complexidade. É um salto importante, mas não é o único. A produção da vacina para a gripe aviária é fundamental porque, se houver uma pandemia, a vacina não estará disponível para os países em desenvolvimento”, destacou. Raw afirmou que o Brasil é pioneiro na produção pública de vacinas, com o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz. “A China não dá vacina de graça, a não ser para uma parcela mínima da população. Na Índia, o sistema é todo privado. O Brasil vacina todo mundo. Queremos entrar na competição internacional e pressionar para baixo o preço do produto.”
Instalações high-tech
Com equipamentos de última geração – a maior parte fabricada no Brasil – o novo laboratório foi projetado para ser uma das poucas fábricas de biosegurança de nível 3, conforme certificação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a exemplo da futura unidade de vacinas contra a gripe aviária, de acordo com a diretora da Divisão de Produção do Instituto Butantan, Hisako Higashi. Segundo Hisako, cada lote da vacina demora dois meses para ser produzido. “Mas o primeiro lote deverá ficar pronto dentro de oito meses, porque ainda haverá um processo de qualificação dos equipamentos e do ar-condicionado especial que faz a desinfecção do ar em todo o interior da fábrica”, disse.
O processo de fabricação da vacina é feito com ovos de galinha, nos quais o vírus ativo é inoculado para a produção da vacina. A fábrica recebe 123 mil ovos por vez. “Cada ovo corresponde a uma dose. Eles passam por uma desinfecção e são incubados por 11 dias antes de entrarem na área de biossegurança”, explicou Hisako. Um equipamento inocula o vírus na câmara de ar interna dos ovos, que são enviados para outra incubadora na qual ficam de 30 a 96 horas. Os ovos seguem para uma câmara fria, cuja função é matar o embrião. Um equipamento separa o líquido alantóide em que está a vacina do embrião morto e cascas. Os dejetos são triturados e desinfectados. “Depois, misturamos citrato ao líquido alentóide e centrifugamos para tirar as impurezas. Com isso, dos cerca de 1.350 litros restam apenas 150, que são fracionados e enviados para a ultracentrífuga, uma das duas existentes na América Latina – a outra também está no Butantan, na unidade de produção de vacina contra a hepatite B – em seguida, sobram 25 litros, que são diluídos e tratados com substâncias químicas para matar o vírus. Finalmente, passamos à formulação farmacêutica”, explicou a cientista.
Próximas fábricas
Além da fábrica de vacina contra a gripe, o Instituto Butantan abrigará, a partir de 2009, uma unidade de hemoderivados e outra de vacinas contra o rotavírus. Tem ainda uma fábrica piloto pronta para a produção da vacina contra a gripe aviária. A fábrica de hemoderivados produzirá imunobiológicos a partir do fracionamento do plasma de sangue humano, como imunoglobulinas e albuminas, além de fatores de coagulação. Hoje, esses procedimentos são realizados na Europa. Segundo a Secretaria de Saúde de São Paulo, a fábrica terá capacidade para processar 150 mil litros de plasma por ano. O Estado responde pela metade de todo o plasma sanguíneo coletado no Brasil. A fábrica de vacinas contra o rotavírus deverá produzir 10 milhões de doses por ano, suprindo toda a demanda nacional. O excedente poderá ser exportado. A vacina contra o rotavírus – que causa diarréias graves principalmente em crianças – faz parte do calendário nacional de imunização desde 2006. O Ministério da Saúde gasta cerca de US$ 60 milhões por ano na importação do produto.
A fábrica piloto de vacina contra a gripe aviária aguarda a licença de manipulação do vírus pela CTNBio. O Butantan é um dos cinco centros produtores de vacina do mundo que compõem a força-tarefa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o combate a gripe aviária. “Nosso objetivo é desenvolver uma vacina segura, eficaz e de baixo custo, que permita proteger o Brasil no caso de uma eventual pandemia”, disse Isaias Raw. Segundo o cientista, a vacina que está sendo produzida em países desenvolvidos custa cerca de US$ 30 por dose, o que tornaria inviável para países mais pobres. “O Butantan produzirá a vacina com um novo adjuvante que descobrimos e que poderá baixar os custos em até 10 vezes”, afirmou.
Fonte: Agência Fapesp
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