Eusebio Val
No Havaí, uma das mais recentes batalhas sobre o turismo sustentável está em curso. A campanha dos ecologistas contra o Hawaii Superferry, o primeiro sistema de balsas para transporte de passageiros entre as ilhas do arquipélago, é uma tentativa quase desesperada de impedir a massificação e preservar o que ainda resta de um riquíssimo ecossistema que, durante milhares de anos, esteve protegido por sua posição isolada no meio do Oceano Pacífico. A entrada em operação do Hawaii Superferry, um serviço de balsas formado por velozes catamarãs de 106 m de comprimento, foi suspensa quase duas semanas atrás quanto grupos ecologistas e cívicos bloquearam o porto da ilha de Kauai. O assunto será resolvido agora pelos tribunais, e gerou forte polêmica entre os cidadãos do arquipélago, que se tornou o último dos Estados a ser incorporado aos Estados Unidos, em agosto de 1959.
O cerne da controvérsia são as conseqüências ambientais do serviço de balsas. As organizações de conservação ecológica alegam que um barco com velocidade tão elevada - as balsas são capazes de atingir os 35 nós (63km/h) - representa grande perigo para as baleias que procriam na região. Eles argumentam, além disso, que o tráfego constante entre as ilhas e o transporte de veículos - cerca de 300 por viagem- representaria ameaça de introdução de espécies vegetais e animais invasivas, de algas marinhas que poderiam proliferar em novas águas a vírus capazes de matar abelhas. A defesa contra a invasão de espécies de não autóctones e contra as pragas vindas de fora é uma obsessão nos Estados Unidos, especialmente em um lugar de características tão singulares quanto o Havaí. Atualmente, o transporte de passageiros entre as ilhas é realizado apenas por avião, com tarifas bastante econômicas. O Hawaii Superferry envolveu custo de US$ 300 milhões na construção das embarcações e em reformas nos portos. A primeira fase prevê rotas entre Oahu - a ilha mais povoadas, que abriga a capital do Estado, Honolulu -, e as ilhas de Kauai e Maui. Cada viagem levará cerca de três horas.
Posteriormente, há planos para ampliar o serviço e incluir uma rota entre Oahu e a Big Island - a maior ilha do arquipélago, que abriga um impressionante parque nacional de vulcões ativos. Esse percurso levaria mais de quatro horas. Na sexta-feira, um juiz de Kauai se pronunciou inicialmente em favor da companhia de navegação, mas sua decisão será revisada. Nos tribunais de Maui, um processo paralelo sobre o serviço ainda está em curso. Os responsáveis pelo Hawaii Superferry não querem se aventurar a retomar o serviço até que a Guarda Costeira norte-americana garanta que as embarcações possam usar os portos havaianos sem risco de sabotagem. Os ecologistas exigem que o Departamento de Transportes havaiano prepare um relatório sobre o impacto ambiental do serviço. Isso poderia retardar a entrada em operação das balsas em oito meses. "Não nos opomos a que exista um serviço de balsas entre as ilhas, e achamos bom que o monopólio das linhas aéreas seja rompido, mas é preciso agir com grande cautela, minimizando o impacto ambiental", disse Irene Bowin, diretora executiva da Maui Tomorrow, uma das organizações ecológicas envolvidas na campanha.
Nascida em Los Angeles, Bowin mora em Maui há mais de 30 anos. "Creio que no Havaí estejamos vivendo um momento crítico quanto à salvação daquilo que faz de nós um lugar especial", disse a ativista. "Fico um pouco triste quando percebo que estamos nos transformando em alguma coisa como o sul da Califórnia". A disputa sobre o serviço de balsas é sintoma da crescente inquietação popular quanto ao crescimento descontrolado do turismo. O arquipélago tem 1,3 milhão de moradores permanentes em área quase igual à da Catalunha, e recebe sete milhões de turistas ao ano, se bem que haja muitos locais em que a presença humana é bastante rara. Em Kauai e Maui, o medo é que a balsa sirva de válvula de escape para a superpovoada Oahu, e que as duas ilhas terminem parecidas com ela. Há preocupações bastante concretas de parte dos pescadores, das empresas de locações de veículos e até de profissionais como pedreiros, encanadores e eletricistas, que temem perder clientes para concorrentes sediados em Oahu, graças à facilidade de comunicação marinha. Situados a 3,7 mil km da costa da Califórnia, e bastante distantes das demais ilhas habitadas do Pacífico, os havaianos hesitam quanto à possível perda de alguns dos privilégios que a distância lhes confere.
Fonte: La Vanguardia
Nenhum comentário:
Postar um comentário