Fábio de Castro
Um estudo realizado no Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP) detectou, em amostras de zooplâncton de estuários paulistas, a presença do vibrião da cólera (Vibrio cholerae) em concentrações mais altas que as registradas na literatura mundial. O estudo, resultado da trabalho de mestrado de José Eduardo Martinelli, orientado pelo professor Rubens Lopes, do Departamento de Oceanografia Biológica, também revelou um dado inédito: o vibrião está associado a diversas espécies de animais que compõem o zooplâncton, e não apenas aos crustáceos.
Zooplâncton é o conjunto de animais aquáticos que têm baixa capacidade de locomoção, sendo levados pelas correntes oceânicas. “A bactéria possui uma enzima que degrada a quitina, um polissacarídeo presente na carapaça dos crustáceos. Por isso, sabia-se que ela aderia a esses organismos. Descobrimos que ela também se associa a muitos outros organismos, o que amplia o número de reservatórios naturais do Vibrio cholerae”, disse Martinelli à Agência FAPESP.
De acordo com o pesquisador, o vibrião se encontra associado ao zooplâncton em concentrações que podem alcançar mais de mil vezes a densidade das bactérias livres na água. “A ingestão de um só desses organismos pode conter a dose mínima de bactérias necessária para a manifestação da doença, se ela for de uma cepa patogênica”, afirmou.
O estudo, no entanto, não avaliou a patogenicidade das bactérias, limitando-se a enfocar sua presença, distribuição espacial e associação taxonômica. Apesar disso, o trabalho enfocou os únicos dois sorogrupos da bactéria – o O1 e o O139 – capazes de causar grandes surtos e epidemias. “O sorogrupo O1 foi detectado em 88% e o O139 em 77% das amostras de plâncton no complexo estuarino de Santos-Bertioga e na plataforma continental ajacente. Os valores são mais altos que os publicados na literatura mundial para outros estuários. Na plataforma, a presença dos sorogrupos foi menor devido à salinidade mais elevada”, disse.
Para as análises, o pesquisador utilizou um kit de imunoflorescência que detecta a bactéria, embora não dê indicações sobre sua patogenicidade. “O anticorpo para o grupo O139 não está com a especificidade monoclonal comprovada, o que significa que pode se ligar a outras cepas da bactéria. Por isso será necessário fazer outros experimentos para validar esse relatório”, disse Martinelli. O pesquisador ressalta que o aspecto mais importante do estudo foi a associação do vibrião a outros organismos além dos crustáceos, sendo que alguns deles não produzem quitina. Foram testados isoladamente 43 táxons, pertencentes a nove filos. “Encontramos dados inéditos, como a presença da bactéria associada a quetognatos, estágios larvais de equinodermos, urocordados e ovos de peixes. O trabalho, então, mostra uma ampla capacidade da bactéria em aderir a diversos táxons do zooplâncton marinho”, destacou.
Fonte: Agência Fapesp
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