segunda-feira, 24 de março de 2008

Planta invasora altera ecossistema em parque dos EUA

Jim Robbins

O verdejante vale de Lamar, no canto nordeste do Parque de Yellowstone, nos Estados Unidos, é famoso por sua fauna, especialmente as grandes manadas de bisontes e cervos, e as alcatéias de lobos que os caçam. Mas o aquecimento favorece o crescimento de uma planta não-nativa que está sobrepujando as outras. As conseqüências são o desequilíbrio ambiental e a formação de um novo ecossistema.

Ao caminhar pela região de Lamar no final do ano passado, Robert Crabtree, diretor científico do Centro de Pesquisa Ecológica de Yellowstone, em Bozeman, Montana, encontrou um vasto número de mudanças ecológicas em curso. O número de ursos e de gophers (animais semelhantes às marmotas) aumentou consideravelmente, no vale. Segundo Crabtree, a expansão foi possibilitada pela difusão de uma planta invasiva de origem mediterrânea, cujo crescimento é beneficiado pelo clima mais quente. "Estamos nos estágios iniciais de desenvolvimento de um novo ecossistema", diz ele, "e diferente do que tínhamos visto até o momento".

A planta, conhecida como cardo do Canadá, oferece alimento aos ursos de mais de uma maneira, mas também pode estar expulsando as plantas nativas, que não conseguem concorrer contra ela. O cardo do Canadá apareceu inicialmente na América do Norte centenas de anos atrás e existe em Yellowstone pelo menos desde o século XIX, segundo Crabtree. Devido à vasta extensão de seu sistema de raízes, é difícil eliminá-las por fumigação, e os funcionários do parque em larga medida abandonaram os esforços para controlar sua presença. E a elevação das temperaturas médias as beneficiou. As áreas ao longo do rio Lamar, que no passado eram pantanosas, terminaram por secar devido a uma seca iniciada por volta de 2000 e à medida que o solo perde a umidade, o cardo do Canadá se expande. Crabtree teoriza que seu ritmo anual de expansão no vale tenha dobrado desde 1989, quando ele começou a pesquisar o ecossistema local.

Planta traz o gopher

E aí surge o gopher miniatura, um animal muito enérgico, com peso de cerca de um quarto de quilo, que escava túneis de profundidade não muito grande. Os gophers adoram as raízes abundantes da planta, repletas de amido, e escavam por sob elas para encontrar os tubérculos. O que eles não comem, armazenam sob plantas ou rochas. A expansão dos gophers miniatura e do cardo do Canadá não é gradual, diz Crabtree, mas funcionam na forma de um loop acelerado de reforço positivo. À medida que os gophers escavam, eles revolvem o solo da superfície e criam o habitat ideal para ainda mais cardos do Canadá. Em outras palavras, os roedores ajudam na difusão da planta, e o crescimento do volume da planta na área ajuda a atrair mais gophers.
"Os animais estão, inconscientemente, cultivando sua fonte de alimento", afirma Crabtree. O número deles triplicou na região, desde o final dos anos 80, diz.

Gopher atrai ursos

De sua parte, os ursos descobriram os depósitos de comida dos gophers, e costumam saqueá-los. Como resultado, o vale de Lamar está repleto de buracos deixados pelos ursos que escavam em busca de raízes acumuladas pelos roedores. Os ursos também se alimentam dos gophers e de seus filhotes. Crabtree acredita que os ursos tenham começado a se alimentar a sério com essa nova fonte de comida em 2004 - um ano desfavorável para a produção de outro dos componentes da dieta básica ursina: as pinhas dos pinheiros de casca branca que são característicos da região. Agora, acrescenta o especialista, eles parecem ter transformado o consumo das raízes de cardos do Canadá e dos gophers miniatura em hábito.

Tom Oliff, o diretor científico do parque de Yellowstone, confirma que a temporada de crescimento do parque se expandiu em 20 dias ao ano, da metade da década de 90 para cá, o que pode explicar a difusão do cardo do Canadá. Oliff diz que o parque reduziu os esforços de controle porque indícios apontam que a planta passa por ciclos de expansão e contração, e que seu alcance provavelmente se reduziria naturalmente. Quanto à idéia de um novo ecossistema, Oliff responde que "é interessante. Será que é verdade? Uma boa pergunta". Charles Schwartz, líder de um grupo de estudos que pesquisa os ursos, diz que sua organização não tem como determinar se existem de fato mais ursos no vale, agora. "Acredito que o que ele esteja constatando seja verdade", afirma sobre o trabalho de Crabtree. "Não seria surpresa ver uma transferência de espécimes individuais para tirar vantagem do suprimento abundante de comida em algum lugar".Determinar se essas mudanças persistirão em prazo mais longo, diz ele, é outra questão.

À medida que as alterações climáticas modificam os ecossistemas, diz Crabtree, as espécies que sairão vitoriosas são aquelas que conseguem adaptar melhor seus sistemas de alimentação, como os ursos, que comem de tudo - de formigas a cervos -, e as que sairão derrotadas são as espécies mais especializadas, que não conseguem se adaptar. Ele diz que uma das espécies especializadas que se encontram em declínio é a da doninha de cauda longa. Ela se alimenta primariamente de ratos silvestres, uma outra espécie em declínio. As mudanças no vale de Lamar talvez apontem para uma nova abordagem com relação às espécies invasivas, que vêm sobrepujando muitos sistemas naturais. "As invasivas são a maior ameaça individual à biodiversidade", afirma Crabtree. Com a redução dos orçamentos dedicados ao controle de espécies invasivas, ele sugere um sistema de triagem. "Se você vai desistir de uma espécie", ele diz, "é melhor desistir de uma que tenha valor ecológico".

Fonte: The New York Times

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