Do The New York Times
Parece alquimia: uma empresa iniciante do Vale do Silício anunciou ter descoberto uma maneira de capturar emissões de dióxido de carbono de usinas de energia acionadas por carvão e gás e aprisioná-las no cimento. Caso o processo funcione em escala maciça, a empresa, Calera, poderia transformar esse carbono em ouro.
A produção de cimento é uma das grandes fontes de emissões de carbono dos Estados Unidos, e as usinas de eletricidade acionadas a carvão são a maior fonte. As nações de todo o mundo estão pressionando companhias a reduzir suas emissões de gases causadores do efeito-estufa, e uma tecnologia que permita que lucrem ao realizar essa missão seria altamente popular. De fato, os materiais promocionais da Calera podem ser um dos raros exemplos de comunicação em que elogios do Sierra Clube e de uma companhia de carvão aparecem lado a lado.
"Com essa tecnologia, o carvão poderia ser menos poluente que a energia solar e eólica, porque elas têm no máximo a aspiração de serem neutras em termos de emissões", disse Vinod Khosla, um bilionário do Vale do Silício cuja empresa, a Khosla Ventures, tem cerca de US$ 50 milhões investidos na Calera. Na segunda-feira, o grupo deve anunciar um novo investimento, de US$ 15 milhões, pela Peabody Energy, a maior companhia mundial de carvão.
Ainda que a Calera já tenha um projeto piloto em operação, ainda não está comprovado que o processo possa ser usado em escala industrial ou que haverá compradores para o cimento que ele produziria.
Alguns cientistas especializados em questões climáticas e profissionais do setor de cimento duvidam que a companhia consiga produzir grandes quantidades de cimento durável e benéfico para o meio ambiente. "As pessoas estão estudando maneiras de fazê-lo há 15 anos", disse Ken Caldeira, especialista no ciclo de carbono e cientista sênior na Carnegie Institution for Science, em Stanford. "A ideia de que eles sejam capazes de desenvolver algo que seja ao mesmo tempo passível de uso em larga escala e apresente custo favorável é algo quanto ao que continuo altamente cético".
Os grandes emissores de carbono e empresas de tecnologia ecológica vêm tentando descobrir maneiras de capturar e armazenar carbono, como por exemplo injetá-lo no solo, para o caso de o Congresso norte-americano começar a regulamentar as emissões de carbono.
A Calera afirma que transformar carbono em material de construção fará da redução de emissões uma atividade economicamente atraente, mesmo em locais nos quais não exista subsídio do governo ou impostos sobre as emissões. "No caso dessa técnica, ela representa literalmente uma fonte de lucros", disse Brent Constantz, fundador e presidente-executivo da Calera.
Constantz, que é professor e consultor na escola de ciências da Terra na Universidade Stanford, passou sua carreira estudando e criando diferentes tipos de cimento. Quando aluno de pós-graduação, ele estudou a forma pela qual os corais do Caribe utilizam dióxido de carbono a fim de produzir seus esqueletos. Criou duas empresas, a Norian e a Skeletal Kinetics, que produzem um cimento de cálcio-fosfato usado por cirurgiões no reparo de ossos fraturados.
Em 2007, ele e Khosla desenvolveram os planos para a Calera. Hoje, Khosla é, na prática, membro da diretora executiva, e se envolve em detalhes de gestão, conversando com os executivos do grupo a cada dia.
Embora a empresa se recuse a revelar detalhes exatos sobre seu processo, informa que combina dióxido de carbono a salmoura marinha ou do lençol freático, um composto que contém cálcio, magnésio e oxigênio. O material resultante é carbonato de cálcio e carbonato de magnésio, usados para produzir cimento e massa. A companhia planeja vender o material para empresas de concreto, que podem aproveitá-lo em trabalhos de pavimentação.
Para tornar o seu cimento mais aceitável aos fabricantes do tradicional cimento Portland, a companhia também vai produzir misturas com 20% de cimento Calera e 80% de cimento Portland, o adesivo de silicato de cálcio usado no concreto de pontes, rodovias e edifícios.
Em Moss Landing, na costa da baía de Monterey, uma grande usina de gás natural da Dynegy despeja fumaça cinzenta na atmosfera; a fumaça contém largo volume de dióxido de carbono, um dos gases causadores do efeito-estufa.
Agora, grandes e enferrujados tubos se estendem da usina à fábrica de cimento que a Celera instalou para demonstração. A Celera bombeia o gás da chaminé para um recipiente azul de grande porte, no qual água salgada extraída do mar é combinada ao gás, produzindo um líquido branco leitoso. O líquido é transferido a uma cuba que separa os sólidos da água, e despeja uma substância branca que parece pasta de dente.
Uma secadora - acionada pelos resíduos de ar quente do gás de exaustão -transforma a pasta em pequenas partículas de cimento e massa. A Calera pretende filtrar a água residual do processo, remover o sal e vendê-la. De acordo com um estudo da consultoria R. W. Beck, contratada pela Calera, o método resulta na captura de 86% do gás de chaminé da usina da Dynegy.
A Calera, que trabalhou com a Bechtel no projeto e construção de fábricas de cimento, planeja abrir sua primeira unidade comercial no ano que vem. A empresa está negociando com a Dynegy e com uma empresa de energia da Pensilvânia, e recebeu verbas do governo australiano a fim de construir uma fábrica de cimento ao lado de uma usina de energia acionada a carvão no Estado australiano de Victoria.
Não creio que ninguém vá acreditar de todo em nós antes que tenhamos a fábrica funcionando", disse Constantz.
Tradução: Paulo Migliacci ME
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