segunda-feira, 17 de maio de 2010

Jeremy Jackson: Como nós destruímos o oceano

Nesta estimulante apresentação, o ecologista de recife de corais Jeremy Jackson fala sobre o alarmante estado dos oceanos hoje: com pesca indiscriminada, superaquecido, poluído, e tudo indica que a situação só vai piorar. Estatísticas e fotos incríveis corroboram o caso.

Sou um ecologista, um ecologista de recife de corais. Eu comecei na baía Chesapeake e mergulhei durante o inverno e de repente me tornei um ecologista tropical. E foi bastante divertido por mais ou menos 10 anos. Alguém paga para você viajar pelo mundo e observar alguns dos lugares mais lindos do planeta. E era isso o que eu fazia.

Eu acabei indo para a Jamaica, nas Índias Ocidentais, onde os recifes de corais eram realmente uns dos mais extraordinários, estruturalmente, que já tinha visto na vida. E esta foto aqui, muito interessante, mostra duas coisas. Primeiro, é preto e branca porque a água era tão clara e você podia ver tão longe e o filme era tão lento nos anos 60 e começo dos 70, que você tirava fotos em preto em branco. Outra coisa que ela mostra é que, embora haja esta linda floresta de coral, não há peixes nesta foto.

Os recifes da baía do Descobrimento na Jamaica foram os mais estudados do mundo, por 20 anos. Nós éramos os melhores e mais brilhantes. Pessoas vinham da Austrália para estudar nossos recifes, o que é engraçado pois agora nós vamos até lá. E a visão dos cientistas sobre como os recifes funcionam, como deveriam ser, era baseada nestes recifes sem peixes. Então, em 1980, houve um furacão, o Furacão Allen. Eu coloquei metade do laboratório na minha casa. O vento era muito forte. As ondas eram de quase 8m a 16m. E os recifes desapareceram, e novas ilhas se formaram. E pensamos: “Bem, somos espertos. Sabemos que furacões sempre aconteceram no passado.” E publicamos um artigo na Science, a primeira vez que qualquer um descreveu a destruição de um recife de coral por um furacão. E previmos o que aconteceria.

E erramos feio. E a razão foi a pesca indiscriminada, e porque a última criatura restante, um ouriço-do-mar, morreu. E dentro de poucos meses depois que o ouriço-do-mar morreu, macroalga começou a crescer. E este é o mesmo recife. Este é o mesmo recife 15 anos atrás. Este é o mesmo recife hoje. Os recifes de corais da costa norte da Jamaica têm uma pequena porcentagem de corais vivos e muitas macroalgas e musgo. E esta é mais ou menos a história dos recifes de corais do Caribe, e cada vez mais, de forma trágica, os recifes de corais do mundo.

Essa é a minha pequena e deprimente história. Todos nós com 60 ou 70 anos temos histórias deprimentes similares. Existem dezenas de milhares dessas histórias por aí. E fica mais difícil idealizar uma noção de bem-estar, porque só está piorando. E está ficando pior porque, depois de um desastre natural, como um furacão, costumava haver um tipo de cadeia de sequência de recuperação, mas o que acontece agora é que a pesca indiscriminada, a poluição e mudança climática estão interagindo para que isso não aconteça. Então eu vou explicar esses três tipos de coisas.

Ouvimos bastante sobre o colapso do bacalhau. É difícil de imaginar que duas, ou alguns historiadores diriam três, guerras mundiais aconteceram durante a era colonial pelo controle do bacalhau. O bacalhau alimentava a maioria da população na Europa Ocidental. Alimentava os escravos trazidos para as Antilhas. A música “Jamaica Farewell” — “Arroz aki e peixe salgado são bons” — é um emblema da importância do bacalhau vindo do nordeste do Canadá. Tudo acabou nos anos 80 e 90. 35.000 pessoal perderam o emprego. E este foi o começo de um certo esgotamento em série de espécies maiores e mais saborosas para menores e não tão saborosas, de espécies que eram locais, para as que estavam ao redor do mundo, e o que temos? É um pouco difícil entender isso, pois você pode ir ao supermercado Costco nos EUA e comprar peixe barato. Você tem que ler o rótulo para saber de onde vem, mais ainda é barato, e todos acham que está tudo bem.

E é difícil comunicar isso. E acredito que uma maneira interessante é falar sobre pesca esportiva, porque as pessoas gostam de sair e pegar um peixe. Fazer o quê?… Esta foto mostra o peixe-troféu, o maior peixe fisgado por pessoas que pagam muito dinheiro para subir num barco, ir para um lugar fora de Key West na Flórida, beber muita cerveja, jogar os anzóis na água, voltar com o maior e melhor peixe, e os peixes-troféu campeões são pendurados e as pessoas tiram uma foto, e este cara está realmente muito emplogado com o peixe. Bom, isso é assim agora, mas olha como era nos anos 50, do mesmo barco, no mesmo lugar no mesmo quadro, no mesmo píer. E os peixes-troféu eram tão grandes que não se poderia colocar esses peixes pequenos junto. E a média dos peixes-troféu pesavam de 110kg a 135kg, peixes meros gigantes. E se você quisesse sair e matar algo, você podia ter quase certeza que pegaria um desses peixes. E eram muito saborosos. E as pessoas pagavam menos nos anos 50 para pegá-los do que as pessoas pagam agora para pegar esses peixes minúsculos. E isso acontece em todo lugar.

Mas não são só peixes que estão desaparecendo. A pesca industrial usa coisas grandes, grande maquinário. Usamos redes que medem mais de 30km. Usamos linhas enormes com um milhão ou dois milhões de ganchos. E usamos rede arrastão, que significa pegar algo do tamanho de um trailer e que pesa milhares e milhares de quilos, colocar numa corrente enorme, e arrastá-lo através do leito do oceano para revolver o chão e pegar os peixes. E pensem nisso como sendo a demolição de uma cidade ou de uma floresta, porque elimina tudo do caminho. E a distruição do habitat é inacreditável. Esta é uma foto, uma foto típica de como as plataformas continentais do mundo se parecem. Vocês podem ver as linhas no fundo, da mesma forma como você vê as linhas num campo que acabou de ser arado para plantar milho. Essa era uma floresta de esponjas e corais, que é um habitat crítico para o desenvolvimento de peixes. E agora é lama. E a área do leito do oceano foi transformada de floresta para lama, estacionamento, é equivalente a toda a área de todas as florestas que já foram cortadas em todo o planeta na história da humanidade. E conseguimos fazer isso nos últimos 100 a 150 anos.

Geralmente pensamos em vazamentos de óleo em mercúrio, e ouvimos muito sobre plástico atualmente. E tudo isso é revoltante, mas o que é realmente insidioso é a poluição biológica que acontece por causa da magnitude das mudanças que isso causa a todos ecossistemas. E eu vou falar rapidamente sobre dois tipos de poluição biológica. Uma é espécies introduzidas, e a outra é o que vem dos nutrientes. Esta é a infame caulerpa taxifolia, a chamada alga matadora. Um livro foi escrito sobre ela. É meio que constrangedor. Foi acidentalmente liberada de um aquário em Mônaco. Foi criada para tolerar o frio, para ficar nos aquários das pessoas. É bem bonita, e rapidamente começou a crescer muito além do que uma vez foi uma rica biodiversidade do noroeste do Mediterrâneo. Não sei quantos de vocês lembram do filme “A Pequena Loja dos Horrores,” mas esta é a planta da “Pequena Loja dos Horroes.”

Mas ao invés de devorar as pessoas na loja, o que ela faz é crescer e sufocar quase toda a vida que existe no leito de toda a parte noroeste do Mar Mediterrâneo. Não sabemos de nada que coma essa alga. Estamos tentando todo o tipo de genética para descobrir algo que possa ser feito, mas por enquanto ela é o monstro do inferno, e ninguém sabe o que fazer com ela.

Outra forma de poluição que é poluição biológica é o que acontece com o excesso de nutrientes. A revolução verde, todo esse fertilizante de nitrogênio artificial foi usado em excesso. Ele é subsidiado, uma das razões porque usamos em excesso. Ele vai através dos rios, e alimenta o plâncton, as células microscópicas das plantas nas águas costeiras. Mas já que comemos todas as ostras, e todos os peixes que comeriam o plâncton, não há nada para comer o plâncton. E a cada dia mais e mais aparece, e isso morre de velhice, o que não tem precedentes para plâncton. E quando morre, cai até o leito e então apodrece, ou seja, entra em decomposição pelas bactérias. E durante o processo, elas usam todo o oxigênio.

E usando todo o oxigênio, elas fazem o ambiente ser absolutamente letal para tudo que não consegue nadar para longe. Então o que temos no fim é um zoológico microbial, dominado por bactérias e águas-vivas, como podem ver à esquerda em sua frente. E a única pesca restante, e é uma pesca comercial, é a pesca de águas-vivas à direita, onde costumava ter camarões pitu. Até mesmo em Newfoundland, onde costumávamos pegar bacalhau, temos agora pesca de águas-vivas.

E uma outra versão disso é o que é chamado de marés vermelhas ou desabrochar tóxico. Esta foto é surpeendente para mim. Falei sobre ela um milhão de vezes, mas é inacreditável. Na parte superior direita da foto à esquerda é quase o delta do Mississippi, e a parte de baixo esquerda da foto é a fronteira do Texas com o México. Estamos olhando para todo noroeste do Golfo do México. Você está olhando para um desabrochar tóxico de dinoflagellate que mata peixes, feito por aquela linda criaturinha na parte de baixo direita. E na parte de cima direita você vê o que parece uma nuvem preta movendo-se para a costa. Esta é a mesma espécie. E à medida que vem para a costa, e o vento sopra, e gotículas de água sobem para o ar, as emergências dos hospitais lotam com pessoas com doenças respiratórias agudas.

Essas são casas de repouso na costa oeste da Flórida. Um amigo e eu fizemos algo em Hollywood que chamamos de noite do oceano Hollywood. E eu tentei achar uma maneira de explicar aos atores o que está acontecendo. Eu disse: “Imagine que você faz um filme chamado ‘Fuga de Malibu’ porque todas as pessoas lindas mudaram-se para North Dakota, onde é limpo e seguro. E as únicas pessoas restantes são as pessoas que não podem pagar para mudarem-se da costa, porque a costa, ao invés de ser um paraíso, é um perigo para sua saúde.”

E isso é incrível. Foi quando eu estava em férias no último outono na França. Isto é da costa da Bretanha, que está sendo envolvida neste musgo verde de algas. A razão porque atraiu tanta atenção, além do fato de ser nojento, é que os pássaros que sobrevoam a área são asfixiados pelo cheiro e morrem, e um fazendeiro morreu também, e você pode imaginar o escândalo que foi. Então há esta guerra entre fazendeiros e pescadores sobre tudo isso. E o resultado disso é que as praias da Bretanha têm que ser limpas disso regularmente.

E, claro, tem a mudança climática, e todos sabemos sobre mudança climática. E acho que o ícone disso é o derretimento do gelo no Mar Ártico. Pensem nas milhares e milhares de pessoas que morreram tentando achar a Passagem do Noroeste. Bem, o Noroeste já está lá. É meio que engraçado, é na costa da Sibéria. Talvez os russos cobrem pedágio. Os governos do mundo estão levando muito a sério. Os militares de nações nórdicas estão levando muito a sério. Pois toda a negação de mudança climática por líderes governamentais, a CIA e as marinhas da Noruega e dos EUA e do Canadá, o que seja, estão ocupados pensando como vão proteger seus territórios desta coisa inevitável do ponto de vista deles. E, é claro, as comunidades nórdicas estão fritas.

Outros efeitos da mudança climática — o “branqueamento” de corais. É uma foto bonita, claro. Os corais todos brancos. Só que eles deveriam ser marrons. O que acontece é que os corais são simbióticos, e têm essas células de algas que vivem dentro deles. E as algas dão açúcar aos corais, e os corais dão para as algas nutrientes e proteção. Mas quando fica muito quente, as algas não conseguem produzir açúcar. Os corais dizem: “Você me enganou, não pagou o aluguel.” Eles expulam as algas e elas morrem. Nem todas morrem; algumas sobrevivem. Algumas mais sobrevivem, mas não são boas notícias. Para tentar entender a situação, imagine que você vai acampar em julho em algum lugar na Europa ou América do Norte, você acorda na manhã seguinte e olha ao seu redor, e vê que 80% das árvores a perder de vista não têm mais folhas e estão lá nuas.

E você volta para casa e descobre que 80% de todas as árvores na América do Norte e Europa perderam suas folhas. E você lê no jornal algumas semanas depois, oh, por falar nisso, um quarto delas morreram. Foi isso que aconteceu no Oceano Índico durante o El Niño de 1998, uma área muito maior do que a América do Norte e Europa, quando 80% dos corais ficaram brancos e um quarto deles morreu.

E a coisa assustadora sobre tudo isso, a pesca indiscriminada, a poluição e a mudança climática, é que cada coisa não acontece no vácuo, mas existe o que chamamos de retorno positivo. As sinergias entre elas que faz tudo ficar muito maior do que a soma das partes. E o grande desafio científico para pessoas como eu pensando em tudo isso, é se nós saberemos solucionar todos esses problemas. Porque, neste ponto, nós podemos proteger. Mas o que isso significa? Nós não sabemos ao certo.

Então como serão os oceanos em 20 ou 50 anos? Bem, não haverá peixes exeto por alguns vairões, e a água será bem suja, e todas as outras coisas, e cheia de mercúrio, etc., etc. E as zonas-mortas serão ainda maiores, e começarão a se fundir. E podemos imaginar algo como o aumento das zonas-mortas dos oceanos nas margens e no mundo. E certamente você não vai comer o peixe criado ali, porque seria meio que uma roleta russa gastronômica. Às vezes você tem um desabrochar tóxico; às vezes não. Isso não vende.

Mas o que é realmente assustador são as coisas oceanográficas físicas e químicas que estão acontecendo. À medida que a superfície do oceano se aquece, a água fica mais leve quando mais quente, fica cada vez mais difícil para as águas revolverem. Dizemos que torna-se muito mais estratificado. A consequência disso é que todos os nutrientes the abastecem a pesca de anchovetas, de sardinhas na Califórnia, ou no Peru, ou outro lugar, vão diminuir, e as empresas que pescam vão falir. E ao mesmo tempo, a água da superfície rica em oxigênio não consegue descer, e o oceano torna-se um deserto.

A questão é: Como todos nós vamos responder a tudo isso? E podemos fazer tudo para consertar, mas numa análise final, o que realmente precisamos consertar somos nós mesmos. Não são os peixes; não é a poluição; não é a mudança climática. Somos nós, e nossa ganância e necessidade de crescer e nossa ineficácia em imaginar o mundo diferente do mundo egoísta em que vivemos hoje. Então a questão é: Vamos responder ou não? Eu diria que o futuro da vida e a dignidade dos seres humanos dependerá de fazermos isso.

Obrigado.

Sobre Jeremy Jackson
Uma liderança em estudos sobre ecologia e evoluçao de organismos marinhos, Jaremy Jackson é conhecido por seu profundo conhecimento sobre tempos geologicos.

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