Por Luiza Duarte , do UOL
A produção de vinho mundial está sendo ameaçada pelo aumento da temperatura do planeta, apontam estudos feitos recentemente. E a França, segundo maior produtor mundial de vinhos, perdendo somente para a Itália, busca soluções para preservar as safras de uvas e garantir o abastecimento de seus famosos vinhos.
De acordo com especialistas entrevistados pelo Opera Mundi, os impactos diretos do aquecimento global são ciclos da vinha mais curtos, transformações no processo de amadurecimento, proliferação de novas doenças e colheitas cada vez mais precoces.
“Nas últimas três décadas, houve um aumento progressivo da temperatura, o que tem antecipado a data de colheita em 8 a 15 dias”, apontou Joël Rochard, especialista da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) e diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável do Instituto Francês da Vinha e do Vinho (IVF).
Tradicionais vinhos franceses como o Bordeaux, Côtes du Rhônes, Bourgogne, Médoc e o Champagne têm sua autenticidade validada pelo selo "Denominação de Origem Controlada", como acontece com outros produtos agrícolas. Para levar o nome pelo qual é conhecido, o vinho tem que conjugar técnicas de fabricação e tipos de uvas específicos a uma localização geográfica pré-determinada. Com a alteração do clima, zonas vinícolas tradicionais seriam forçadas a se adaptar para guardar as mesmas características do produto final.
Em busca de melhores condições, "poderia haver um deslocamento da produção para o norte, ou a implantação de outras variedades", explicou o enólogo François Fevre. Em ambos os casos, isso significaria abandonar o atual sistema de selos de qualidade e mesmo o paladar das bebidas que conhecemos.
Os franceses são os maiores consumidores de vinho no mundo. Cerca de 600 bilhões de litros saem das vinícolas do país a cada ano. O setor, além ser parte do patrimônio cultural e grande atrativo turístico, gera bilhões de euros todos os anos e quase 200 mil empregos. O impacto econômico da transformação ou morte das zonas vinícolas ainda não pode ser estimado. Os gastos com irrigação serão provavelmente os mais elevados, apontam os especialistas.
As vinhas têm uma vida produtiva de 30 a 40 anos e o momento do plantio representa uma decisão que pode custar caro. Investir numa variedade que não adapte as mudanças do clima é um risco alto para os pequenos produtores.
Os especialistas divergem quanto às consequências de uma elevação maior que 5°C da temperatura e seu inevitável preço para a economia. Rochard lembra que diante desse cenário extremo, inundações, fluxos migratórios e o estresse hídrico afetariam muito mais segmentos do que a viticultura e provavelmente levariam ao caos todos os sistemas produtivos.
Bourgogne
De acordo com Fevre, o caso mais preocupante é o da região da Bourgogne, onde se cultiva apenas uma variedade de uva para o tinto, Pinot noir, e uma para o branco, Chardonnay. “Isso impede a manipulação das proporções dos componentes para aperfeiçoar a bebida, como acontece em outros pólos que produzem mais variedades”, explicou. “Com o calor o pinot noir amadurece mais rápido e produz vinhos de maior teor alcoólico”.
O enólogo garantiu que “não há preocupação há médio prazo em relação aos grandes vinhos franceses”, lembrando que atualmente eles não estão em limite de zona produtiva. “O aquecimento vem até provocando efeitos positivos”, revelou. Segundo ele, as mudanças climáticas não são sentidas da mesma maneira em todas as regiões, portanto, “primaveras menos rigorosas evitam perdas de rendimento com geadas”. Essa fase favorável corre o risco de ser passageira, se as temperaturas continuarem a subir.
Soluções
As medias práticas para conter o impacto do clima nas vinícolas francesas, de acordo com os especialistas, são tornar as garrafas mais leves e privilegiar trens para o transporte, tudo para preservar o sabor. “Também, utilizar menos energia e até mesmo produzir o vinho com o bagaço da uva”, enumera Rochard, que apresentou no Brasil as adegas ecológicas e modelos sustentáveis de produção que desenvolve junto a OVI.
Atualmente na Europa, uma vinha é composta de duas variedades, uma para a raiz e outra que vai definir o tipo da uva. Esse enxerto permite uma maior flexibilidade em relação às mudanças climáticas, uma vez que é possível buscar plantas de base mais resistentes sem alterar o fruto.
Os avanços científicos permitem um conhecimento preciso das técnicas de viticultura. É possível interferir nas características do solo, das vinhas, controlar a exposição solar, alterar as dosagens e desenvolver leveduras especificas. "Nós sabemos o que é preciso para ter uma colheita de qualidade para um tipo de vinho determinado. Temos ferramentas para isso”, garantiu Fevre.
Flexibilizar as normas e alterar o limite das áreas oficiais de produção é outra saída para preservar por mais tempo produtos emblemáticos para a França. Houve uma extensão do território de cultivo de Champagne em direção ao norte e ao oeste e esta expansão pode continuar. Se os estudos “mostrarem que alguns terrenos que antes não faziam parte da delimitação apresentam as condições necessárias, isso pode acontecer”, afirma sem esconder que é preciso muita precaução e investigação para tal medida.
Estudo
Um relatório da ONG ambiental Greenpeace, publicado em 2009, prevê um deslocamento de mil quilômetros das tradicionais zonas de produção de vinho para regiões mais frias até o final do século.
“Na França, a região mais atingida será a mais seca, o sudeste, que inclui as zonas produtivas do Minervois, Côtes du Languedoc, Côtes de Provence, Côtes du Rhône e do Vin Corse”, diz o relatório.
Enquanto o clima do Mediterrâneo pode se transformar em semi-árido, afetando a viticultura na Grécia, sul da Itália, Espanha, Portugal e norte da África, os vinhedos podem virar paisagem comum nos países do norte. “A Inglaterra produz, por enquanto, apenas vinhos brancos, mas alguns renomados produtores de champagne já começaram a investir em terrenos que poderão ser interessantes no futuro”, afirmou Fevre.
Novos atores entram em cena, Rochard aponta o exemplo da Alemanha. “Ela tem uma forte demanda por vinho tinto e tinha sua produção limitada pelas condições climáticas. Agora com o aquecimento tem potencial para produzir bons vinhos tintos”.
Já zonas como a Austrália, que hoje cultivam graças à irrigação podem ser abandonadas com a elevação do custo do fornecimento. “A água vai se transformar em um fator limitante da produção”, avaliou o enólogo.
Consumo
O consumidor já pode sentir o gosto da diferença provocada pelo aquecimento. Fevre define esses vinhos de maturação acelerada como menos ácidos e com maior teor alcoólico, o Millésime 2003, 2005 e 2009 são exemplos. Os vinhos se tornam, mas ricos e “perdem a elegância, embora em relação ao paladar das gerações acostumadas com refrigerantes, isso se torne favorável”.
As “receitas” de família evoluem ao gosto do freguês contemporâneo. “Um vinho como Château Margaux 2009 não é feito como há 20, 50 ou 100 anos atrás, mas ele continua sendo um dos melhores vinhos do mundo”, concluiu Fevre.
Um comentário:
DESAFIOS DA EDUCAÇÃO AMVIENTAL NO SÉCULO XXI
A percepção ambiental da sociedade (base a Região da Grande Vitória / ES) evidencia que a sociedade "conhece" grande parte da terminologia ligada ao tema Mudanças Climáticas, mas não consegue explicar o que cada termo diz respeito; evidencia um sentimento de afastamento em relação ao tema, pois as informações que chegam pela mídia se dividem entre "a favor e contra", o que deixa o "não iniciado" gradativamente desinteressado pelo assunto.
Na área da Educação Ambiental ainda se defende a tese (do século XX) do "quanto mais EA, melhor" (premissa necessária, mas não suficiente em relação ao século XXI), sem que se observe (de forma agressiva, uma vez que os novos cenários assim o exigem) a necessidade de validar as bases de estruturação de um Programa de EA através de uma análise prévia do nível de percepção ambiental do segmento ao qual será oferecido o programa, bem como, após sua conclusão, de realizar pesquisa equivalente para validar (através da alteração da percepção ambiental do segmento) a eficácia do programa adotado. Ou seja, abandonar a tese de que parâmetros como "número de alunos envolvidos", "cartilhas distribuídas", "professores envolvidos", "membros da comunidade envolvidos", "lanches oferecidos", "empresas apoiadoras dos programas", entre outros, sejam indicadores suficientes para assegurar o sucesso de um programa e, sobretudo, dos recursos envolvidos no mesmo.
Estes pontos não devem ser entendidos como "falhas", mas sim como pontos que necessitam de uma profunda reflexão se o objetivo é o da "melhoria contínua". Não admitir a necessidade da reflexão é postergar efeitos que já estão bem visíveis, pelo menos para aqueles que estão sempre abertos as necessidades de reavaliar "premissas".
Roosevelt
Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental / NEPA roosevelt@ebrnet.com.br
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