Doenças bacterianas antes fáceis de tratar estão se tornando desafios maiores. Trabalho comprovou que medicamentos criam bactérias mais resistentes
Há muito tempo os médicos presumiam que o mau uso de antibióticos gerava agentes patogênicos resistentes a medicamentos, mas um estudo publicado nesta sexta-feira (09) na revista científica "The Lancet" finalmente deu evidências de como isto ocorre. Doenças bacterianas antes fáceis de tratar, como tuberculose, gonorréia, tifo e pneumonia, estão se tornando desafios maiores à medida que os germes evoluem para cepas que superam a capacidade da ciência de contê-las.
O novo estudo fornece evidências claras de que o uso de antibióticos inadequados ao tipo de bactéria tratada pode piorar este problema de resistência. Em uma experiência, Surbhi Malhotra-Kumar e uma equipe de microbiólogos da Bélgica e da Holanda empregaram dois antibióticos da classe macrolida -- claritromicina e azitromicina -- que são comumente prescritos para infecções nos brônquios, em dois grupos de 74 pessoas selecionados ao acaso. Os cientistas também deram um placebo para um terceiro grupo de controle. Os indivíduos que tomaram os medicamentos não ficaram doentes. O objetivo era monitorar o efeito dos remédios em bactérias streptococci, que são componentes normais e inofensivos da flora bucal.
O veredicto foi contundente. A azitromicina gerou rapidamente um grande número de bactérias resistentes à macrolida, enquanto a claritromicina encorajou a emergência de uma forma altamente resistente. Esta forma não era apenas mais resistente à macrolida, mas também mostrou uma resistência maior aos antibióticos lincosamida, estreptogramina B e tetraciclina. O estudo descobriu que os antibióticos tiveram um efeito duradouro de mais de 180 dias em bactérias orais. Em outras palavras, a bactéria inofensiva se tornou um reservatório em potencial do DNA resistente a medicamentos de agentes patogênicos. A penicilina é normalmente a arma escolhida para conter formas danosas de streptococci, mas os médicos freqüentemente recorrem à macrolida se um paciente for alérgico a esta droga.
Em um comentário deste trabalho, Stephanie Dancer, microbióloga do Southern General Hospital, em Glasgow, Escócia, disse que a descoberta dá evidências cruciais para sustentar um problema comumente observado sobre antibióticos prescritos ou usados de forma errada.
"Todos nós pudemos ver o que estava acontecendo, mas agora temos uma prova", disse, em entrevista. Os efeitos podem ser ainda maiores, advertiu Dancer. "É um problema imenso, que afeta qualquer agente antimicrobiano que o homem já descobriu", afirmou. "Estamos desperdiçando um recurso precioso".
Ela acusou, particularmente, as compras de antibióticos sem receita na internet, e apelou para o lançamento de uma campanha de conscientização pública para combater o mau uso dos antibióticos.
Fonte: Globo.com
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