sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Retrato do alcoolismo


Grupo liderado por pesquisador da USP quer estudar padrões do consumo de álcool na América Latina para fornecer subsídios que direcionem políticas públicas. Dados científicos sobre o assunto são escassos e fragmentários


Fábio de Castro

No Brasil, 12,3% das pessoas com idades entre 12 e 65 anos são dependentes de álcool, de acordo com a última pesquisa da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) sobre uso de drogas no país, feita em 2005. O número subiu mais de 1% em relação à pesquisa anterior, de 2001. A produção de bebidas alcoólicas se expande a cada ano e tudo indica que o consumo cresce em toda a América Latina.

Embora os dados indiquem um grave problema epidemiológico e a necessidade de providências urgentes, pesquisadores destacam a inexistência de informação científica suficiente para direcionar políticas públicas no setor. Por isso, um grupo liderado pelo médico Arthur Guerra de Andrade, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), decidiu desenvolver uma ampla pesquisa sobre os padrões de consumo de álcool nos países latino-americanos. “Tudo o que temos são dados fragmentários, colhidos por metodologias diferentes, que não fornecem uma fotografia objetiva sobre o consumo de álcool na América Latina. Queremos saber o quanto se bebe em cada região. Mas também precisamos saber quem são os consumidores, qual o contexto social do consumo, quais são as bebidas e quais são os impactos sociais, por exemplo”, disse Andrade à Agência FAPESP.
Andrade pretende angariar fundos para a pesquisa por meio do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa), organização não governamental da qual é presidente. “Para termos uma amostra razoável, com dados confiáveis, projetamos fazer o levantamento, baseado em entrevistas, em 45 localidades de 33 países”, disse. Em uma avaliação preliminar, os pesquisadores calcularam que a pesquisa custaria mais de US$ 3,5 milhões.

Jim Anthony, professor do Departamento de Epidemiologia da Escola de Medicina da Universidade do Estado de Michigan, nos Estados Unidos, um dos principais especialistas do mundo em álcool e drogas, foi convidado para participar do estudo. Anthony veio ao Brasil em fevereiro para discutir o projeto, a convite do Cisa. “Pretendemos ter os dados disponíveis a curto prazo, o que significa de dois a três anos, em termos epidemiológicos”, disse Andrade.

Padrões e diferenças regionais

De acordo com Arthur Guerra de Andrade, é praticamente impossível fazer uma avaliação objetiva sobre o consumo de álcool sem um painel de informações de grandes dimensões. “O álcool é uma droga especial, porque é legalizada e de grande abrangência. O mundo lida com ele de uma forma confusa. Há grandes interesses comerciais envolvidos e, sem dados científicos, cada um tende a fazer as análises de acordo com seus interesses”, disse. Segundo o professor da USP, com a falta de dados específicos para cada região, a Organização Mundial da Saúde (OMS) trata o consumo de álcool de maneira uniforme. “É como se houvesse um padrão único de consumo. Mas suspeitamos que o consumo de cerveja e cachaça, por exemplo, seja muito diferente. E que os impactos de cada bebida variem com o padrão de consumo em cada região. Mas não podemos fazer inferências românticas. Políticas públicas se fazem com dados científicos sólidos”, disse.

O pesquisador afirma que a América Latina precisa ser vista com atenção, uma vez que conta com um crescimento importante no consumo de álcool, mas não sabe se há um só padrão de consumo no continente. “Desconfio que vamos encontrar padrões regionais do uso de substâncias alcoólicas, provavelmente não limitados à demarcação política dos territórios. No Brasil, deverá haver diferença entre padrões regionais”, disse.

Fonte: Agência Fapesp

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