quinta-feira, 24 de maio de 2007

Cruzamento a distância


Pesquisadores da Universidade Federal do Paraná comprovam a viabilidade do cruzamento dirigido de exemplares do pinheiro-do-paraná localizados a grande distância uns dos outros (foto: Flávio Zanette)


Murilo Alves Pereira

Pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) confirmaram a viabilidade do cruzamento dirigido de exemplares do pinheiro-do-paraná (Araucaria augustifolia) localizados a grande distância uns dos outros.

Segundo o coordenador do estudo, o agrônomo Flávio Zanette, do Departamento de Fitotecnia do Setor de Ciências Agrárias da UFPR, os resultados podem tornar-se uma ferramenta importante para estudos que meçam a variabilidade genética nos remanescentes de florestas com araucárias. Até então não se tinha certeza se a evolução de araucárias em regiões distintas atrapalharia o cruzamento entre elas. “A evolução distanciada por um longo período pode gerar uma subespécie ou uma nova espécie”, disse Zanette à Agência FAPESP. Como exemplos, menciona a espécie A. araucana, comum na cordilheira dos Andes e que apresenta grandes semelhanças com a A. augustifolia, encontrada no Sul do Brasil. Segundo o pesquisador, o cruzamento dirigido pode ajudar a impedir a extinção do pinheiro-do-paraná, única espécie do gênero das araucárias no Brasil. “Podemos selecionar os melhores exemplares para fazer o cruzamento e manter a qualidade genética da espécie”, disse.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores separaram o pólen de araucárias machos encontradas em Guarapuava (PR) e em Lages (SC), ambas a mais de 250 quilômetros de distância de Curitiba, onde se encontram as fêmeas. Os botões florais da árvore fêmea foram isolados com sacos plásticos para não serem fecundados naturalmente. O pólen foi então pulverizado sobre o botão, no período de abertura. A polinização, feita em 2005, gerou os primeiros frutos no início deste mês. “Só da primeira pinha, colhemos 92 pinhões”, comemora Zanette. Os pinhões são as sementes da pinha. O pesquisador é pioneiro no cruzamento dirigido de araucárias. As experiências começaram em 2001, em um pinheiro plantado na cidade catarinense de Criciúma. Como não havia outras araucárias no entorno, a árvore gerava pinhas sem sementes. Dois anos após a primeira polinização controlada, foi comprovada a eficácia da técnica com a colheita dos pinhões. Pinheiros isolados

No passado, a floresta ombrófila mista, ou floresta com araucárias, cobria 40% do Paraná. O intenso desmatamento praticamente dizimou a floresta, restando hoje cerca de 0,8% da cobertura original. “O desmatamento isolou os indivíduos; os cruzamentos não ocorrem mais como a natureza quer, mas como o homem permite”, afirmou Zanette. A intensa fragmentação isola araucárias em meio a plantações de soja ou pinus, por exemplo. De acordo com outro estudo da UFPR, o vento é capaz de carregar o pólen por mais de 2 quilômetros. Com isso, um único pinheiro, embora com grande potencial genético, pode morrer sem gerar descendentes.
“Com a técnica, é possível colher o pólen desse pinheiro isolado e fecundar outra árvore localizada a quilômetros dali”, disse Zanette. Ele explica que a distância entre os fragmentos também provoca o cruzamento consangüíneo, ou seja, em um grupo pequeno, indivíduos cruzam muitas vezes entre eles. A consangüinidade enfraquece a espécie, gerando descendentes fracos e que envelhecem precocemente. Se antes as araucárias passavam dos 100 anos, agora, aos 50 anos, já estão bastante debilitadas.

O agrônomo cita estudo feito no Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que apontou em 30% a consangüinidade em alguns pequenos remanescentes de araucária no estado. “O empobrecimento genético da espécie é o primeiro passo para a extinção”, disse. Segundo Zanette, a saída para resolver o problema seria ligar os fragmentos por meio de corredores ecológicos, o que evitaria o cruzamento entre parentes. “Em paralelo a isso, a fecundação artificial é uma ferramenta importante para revigorar a qualidade genética da espécie e impedir o seu desaparecimento”, destacou.

Fonte: Agência Fapesp

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