Ricardo Zorzetto
Como um hábil trapaceiro, o parasita causador da esquistossomose – o verme Schistosoma mansoni – facilmente dribla as defesas do organismo humano e se instala na parede de vasos sangüíneos do intestino. Parte de seus ovos se aloja no fígado, provocando o inchaço desse órgão que deixa 5% de seus 200 milhões de vítimas com o ventre dilatado feito uma bola. Após analisar as alterações do sistema imunológico disparadas pelo agente da esquistossomose, imunologistas de Minas Gerais e da Bahia tentam agora se aproveitar de estratégia semelhante à do parasita para amenizar o desconforto gerado pela asma, inflamação crônica das vias aéreas e dos pulmões provocada por uma super-reação do sistema imunológico a proteínas de ácaros encontrados na poeira, à fumaça ou até a medicamentos.
A saída imaginada por Maria Ilma Araújo e Edgar Marcelino Carvalho, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), é aparentemente simples. Eles buscam desencadear no organismo o mesmo tipo de reação imunológica acionada pelo Schistosoma mansoni – só que sem provocar a doença –, o mesmo princípio de funcionamento das vacinas. Esperam alcançar esse objetivo usando algumas das proteínas que recobrem a superfície do parasita e foram identificadas e produzidas em laboratório por equipes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A equipe da Bahia tem fortes razões para querer imitar a ação desse parasita. Poucos anos atrás, Maria Ilma e Carvalho notaram um efeito intrigante entre os portadores de asma de um vilarejo de pescadores do litoral norte baiano. Parte deles apresentava sinais muito mais brandos que o habitual dessa doença inflamatória que nas últimas décadas vem se tornando mais comum no Ocidente e afeta entre 150 milhões e 300 milhões de pessoas no mundo, tornando o banal ato de respirar um verdadeiro suplício. Investigando o que havia de diferente com esses pescadores, Maria Ilma deparou com um dado inicialmente contraditório: os que apresentavam a forma mais amena de asma não eram necessariamente os mais saudáveis. Na realidade, muitos deles estavam infestados por vermes como o Schistosoma mansoni, comum em comunidades como a da Vila Conde, onde água tratada e esgoto encanado ainda são luxo.
Ante esse resultado, Manoel Medeiros Júnior, da equipe de Maria Ilma, acompanhou durante um ano a saúde de pessoas com asma de três regiões da Bahia – uma em que a esquistossomose é endêmica e duas em que esse problema praticamente não existe. Os dados, publicados em 2003 no Journal of Allergy and Clinical Immunology, confirmaram: a asma era mais amena naqueles que também estavam contaminados com o parasita. Clique aqui para ler o texto completo na edição 138 de Pesquisa FAPESP.
Fonte: Agência Fapesp
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