sexta-feira, 16 de maio de 2008

Contaminação por omissão

Thiago Romero

Um levantamento feito com 272 casos de indivíduos que doaram sangue na Fundação Pró-Sangue, em São Paulo, apesar de estarem infectados com o vírus da Aids, apontou que 48,9% omitiram fatores de risco durante a triagem, o que poderia ter evitado a coleta.

O estudo foi feito por César de Almeida Neto, chefe do Departamento de Notificações e Orientação de Doadores com Sorologias Alteradas da fundação, e apresentado no início do ano como tese de doutorado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Almeida Neto avaliou o perfil de doadores de sangue portadores do HIV entre 1999 e 2003, por meio de um estudo caso-controle, no qual 272 doadores de sangue confirmadamente positivos para a doença, a maioria do sexo masculino, foram comparados com um grupo controle de 468 doadores sem a doença. Os indivíduos foram entrevistados antes e depois da doação. “A entrevista realizada antes da coleta de sangue tem o objetivo de identificar situações de risco que o indivíduo tenha vivido nos últimos meses, uma vez que os exames convencionais para a detecção do vírus da Aids podem não detectá-lo em um primeiro momento, devido ao período que chamamos de janela imunológica.

No caso do HIV, a formação de anticorpos no organismo, que permite a detecção da doença, ocorre de quatro a oito semanas após a infecção”, disse o pesquisador à Agência FAPESP. “Isso significa que se um indivíduo se contamina hoje, e daqui a uma semana vai doar sangue, a doença ainda não se manifestou e seu exame provavelmente dará negativo. Com isso, o sangue do doador pode ser liberado normalmente para uso por outros pacientes, mesmo que esteja com o vírus da Aids. A triagem antes da doação é realizada para identificar riscos potenciais nesse período de janela imunológica”, destacou.

Segundo Almeida Neto, uma mesma bolsa de sangue infectada, ao ser liberada para uso, pode contaminar vários pacientes, uma vez que o sangue normalmente é fracionado em componentes como hemácias, plasma e plaquetas, que podem ser utilizados em três pessoas diferentes, contaminando-as. “Mesmo seguindo todos os procedimentos de segurança, ainda existe o que chamamos de risco residual. Em qualquer lugar do mundo o sangue é uma importante fonte de transmissão de doenças. Ao serem questionados antes da coleta, muitos indivíduos têm vergonha de assumir os fatores de riscos e negligenciam esse tipo de informação.

Outra hipótese é que alguns deles usaram os serviços do banco de sangue para simplesmente fazer ou comprovar o teste do HIV”, disse. “Calcula-se que, no Estado de São Paulo, o risco residual de infecção por Aids em períodos de janela imunológica seja de uma a cada 60 mil transfusões de sangue”, disseAlmeida Neto. Para que isso não ocorra, o pesquisador explica que os interessados em fazer o exame do HIV devem procurar o Centro de Referência de Treinamento em Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e Aids, e não os bancos de sangue.
Fatores de risco potenciais para a Aids, além de dados demográficos dos doadores, número de doações prévias, comportamento sexual e associação com os demais marcadores de triagem sorológica foram algumas informações coletadas nas entrevistas.

O estudo destacou, como fatores de risco para o HIV, entre os homens, as relações sexuais com outros homens, pagar ou receber dinheiro em troca do sexo e ter tido duas ou mais parceiras nos últimos 12 meses. As mulheres com parceiro sexual usuário de drogas injetáveis ou que tiveram dois ou mais parceiros nos últimos 12 meses foram as que apresentaram mais riscos. Mais informações: www.crt.saude.sp.gov.br

Fonte: Agência Fapesp

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