segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Aquecimento vai acelerar migração na PB

Por Jacqueline Santos do Jornal da Paraiba

Calor intenso, terras sem condições de cultivo, baixa oferta de emprego na agricultura e paraibanos saindo das cidades de origem em busca de melhor qualidade de vida. O panorama dramático está previsto no estudo “Mudanças Climáticas, Migrações e Saúde: Cenários para o Nordeste – 2000-2050”, elaborado pela Universidade Federal de Minas Gerais e pela Fundação Oswaldo Cruz. Se um dos prognósticos se confirmar, a região metropolitana de João Pessoa será a segunda do Nordeste onde mais serão sentidas as mudanças no clima em relação aos níveis de migração nos próximos 40 anos.

Por conta das alterações climáticas, a agricultura vai ser afetada e parte da população deve procurar abrigo em áreas menos afetadas do país. A análise mostra que entre os municípios nordestinos com mais de 250 mil pessoas, Campina Grande lidera no prognóstico de maior perda no número absoluto de habitantes, seguida pela cidade pernambucana de Caruaru. O estudo mostra que os municípios mais dependentes do setor agropecuário serão os mais prejudicados com a migração resultante dos efeitos das elevadas temperaturas. Nesses dois casos (Campina e Caruaru) a perda da população pode ter como causa o impacto das modificações no clima em municípios vizinhos e nas economias estaduais.

Se a expectativa pessimista realmente se concretizar, a taxa de migração, que hoje se encontra estável, vai atingir níveis altos em pouco mais de 20 anos e chegar a 0,36% da população nordestina no período entre 2035 e 2040, o que resulta no fluxo migratório de 246.777 pessoas. Nos anos de 2045-2050, a taxa corresponderia a 0,34%, resultando a saída de 236.065 nordestinos de suas cidades de origem. Em uma visão mais positiva, o estudo estima que apenas 13.565 pessoas migrariam no quinquênio 2035-2040 e 20.603 no período de 2045 a 2050.

“Os dados históricos mostram que, desde o início do século passado, o saldo migratório da Paraíba é negativo, sendo ainda menor na última década. O que ocorre é que a taxa de natalidade tem caído muito nos últimos anos e como ainda há uma taxa de migração elevada, em comparação com outras regiões, existe uma previsão de diminuição da população, especialmente na capital e Campina Grande (segunda mais populosa do interior do Nordeste”, detalha José Ivaldo Brito, professor do Departamento de Ciências Atmosféricas (DCA) da Universidade Federal de Campina Grande.

A desaceleração no desempenho econômico, proveniente das mudanças climáticas, deve culminar em um encolhimento da disponibilidade de empregos no Estado, já que a agricultura é base de subsistência para milhares de famílias paraibanas e redução das populações nas áreas em situação mais crítica. Embora a migração a partir de localidades do Nordeste não seja novidade, o clima quente e sem chuvas vai espantar um grande número de pessoas. A constatação feita pela análise alerta que alguns lugares do Semiárido devem se tornar inabitáveis. Previsões como diminuição da frequência de chuvas, solos mais pobres e vegetação com menor diversidade biológica estão descritas no relatório.

Com o declínio no ritmo de crescimento da economia e a pequena oferta de emprego, a tendência é que o poder de compra caia de maneira considerável.
Os resultados serão negativos para toda a atividade econômica, atingindo as taxas de empregabilidade e, consequentemente, a renda das famílias. Esse declínio vai afetar o poder de consumo dos paraibanos, que também foi considerado pelos pesquisadores. Ao analisar a tendência até o ano 2050 na Paraíba, as famílias devem consumir 19,8% menos do que ocorreria sem as modificações no clima. O índice é maior, no entanto, ao programado para a população de Pernambuco, Ceará e Piauí, que terão 18,1%, 16,9% e 15,2%, respectivamente. Os nordestinos, em comparação aos moradores de outras regiões do Brasil, terão chances de sofrer queda acentuada no consumo.

Os efeitos da mudança climática foram sentidos na Paraíba na forma de destruição pelas chuvas. Uma situação que, segundo o secretário de Estado do Meio Ambiente, Recursos Hídricos e da Ciência e Tecnologia, Francisco Sarmento, vem sendo acompanhada.


Chuvas já causaram destruição
Independente de qual seja a causa, as chuvas que caíram em parte do Estado e de várias localidades da região Nordeste resultaram em grandes danos para os moradores das áreas afetadas. Milhares de famílias ficaram desabrigadas ou desalojadas, pontes e estradas foram destruídas, obstruindo os principais acessos e trazendo prejuízos para a economia dessas populações. Segundo relatório da Gerência Executiva Estadual de Defesa Civil, órgão vinculado à Secretaria de Estado da Infraestrutura, no início do ano passado, as chuvas atingiram uma população de mais de 1,7 milhão de pessoas de mais de 100 municípios.

O secretário executivo da Defesa Civil do Estado, coronel Sinval Pinheiro, enumerou os municípios de Sousa, Patos, Santarém e São João do Rio do Peixe como os que sofreram com as intensas chuvas este ano. “Nesses locais, a situação ficou caótica. Houve intervenção de diversos órgãos governamentais.
Quase 1 mil famílias ficaram sem ter onde se abrigar”, citou. Apenas em Sousa, foram improvisados 10 alojamentos para atender os desabrigados. Em Patos, a situação foi a mesma.

O secretário de Estado do Meio Ambiente, Recursos Hídricos e da Ciência e Tecnologia, Francisco Jácome Sarmento, garantiu que estão sendo captados recursos para contornar as dificuldades. “O Ministério da Integração Nacional liberou R$ 16 milhões, fruto de convênio. A última parcela de R$ 11 milhões já foi repassada. O volume será destinado para obras como restauração de estradas, de barragens e barreiros em mais de 20 municípios”, disse.

As enchentes deste ano chegaram a reduzir cerca de 20% a quantidade de grãos plantados em áreas ribeirinhas, em especial no Sertão do Estado. Em Patos e Araruna, por exemplo, os rios transbordaram e arruinaram plantações inteiras de arroz, milho e feijão. Mesmo com essa diminuição na colheita, o supervisor de agropecuária do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), José Rinaldo de Souza, assegurou que não haverá impacto significativo na produção do Estado.

Segundo o instituto, a previsão para 2009 já passou por alterações por conta das chuvas. A estimativa até fevereiro era de uma produção de 301.970 toneladas de grãos, o que equivaleria a um acréscimo de 27% em relação à estimativa aplicada em 2008. “O prognóstico poderia se concretizar caso as condições climáticas se apresentassem favoráveis, mas não foi isso que aconteceu”, lamentou Souza. A estimativa do IBGE é feita com os pesquisadores do órgão que tomam por base informações de técnicos da Emater, secretários municipais de Agricultura, cooperativas do segmento, sindicatos e produtores. (JS)

Fenômeno precisa ser analisado
Na Paraíba, desde 2004 são registrados períodos de intensas precipitações, com chuvas que deixam rastros de destruição em cidades que, em tempos anteriores, eram castigadas pela estiagem prolongada. No entanto, a relação das alterações climáticas no Estado com o aquecimento global não tem embasamento científico.

As consequências que poderiam ser atribuídas às mudanças na atmosfera de todo o mundo está sendo observada pelo paraibano que vive em cidades do interior do Estado, pelo menos nos últimos cinco anos. Um exemplo são as chuvas que deixaram milhares de desabrigados e desalojados e prejuízos em diversos setores: lavouras se perdendo pelo excesso de água, animais mortos, casas indo ao chão, e até mesmo saldos de pessoas mortas.

Mesmo que a mudança de clima esteja patente aos olhos, os especialistas dizem que ainda é muito cedo para relacionar as alterações verificadas por aqui aos efeitos do aquecimento do planeta. A meteorologista da Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba (Aesa), Carmem Becker, disse que seriam necessárias pelo menos duas décadas de análises para atestar a ligação entre os fenômenos. “Para afirmar o efeito do aquecimento global no clima dos municípios paraibanos era preciso vários anos de estudos. Há uns cinco anos começamos a observar ocorrência de muitas chuvas, mas a causa seria outro fenômeno da natureza que não necessariamente tem relação com o aquecimento da terra”, justificou.

Becker disse que as intensas precipitações registradas desde 2004, em anos alternados, devem-se à ocorrência de um fenômeno chamado La Niña, oposto do El Niño, que propicia o aumento do calor nas áreas onde surge. “Esta é a época de fortes chuvas, mas é comum por conta do La Niña que traz o resfriamento das águas do Oceano Pacífico. As mudanças favorecem maiores ventos. Com a alteração da circulação de ventos no globo, o Nordeste recebe mais chuvas, ao contrário da região Sul e Sudeste, que passam a sentir a estiagem. A previsão é de que a situação mude no próximo ano, com o enfraquecimento do La Niña. Até o final de novembro, teremos um prognóstico de como será o quadro nos próximos anos”, acredita.

Se para a Aesa, as mudanças no clima no Nordeste estão longe de ter origem no aquecimento global, especialistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) afirmam que o fenômeno tem tornado as catástrofes cada vez mais comuns no país. Em 2007, durante uma conferência realizada com a participação de técnicos do órgão no Rio de Janeiro, um dos assuntos levantados foi o fato de que o aquecimento tende a produzir mais raios em todo o planeta. (JS)

Previsão é de períodos prolongados de seca
De acordo com o professor do Departamento de Ciências Atmosféricas (DCA) da Universidade Federal de Campina Grande, José Ivaldo Brito, nos quadros mais otimistas, o aumento da temperatura deve ser de 1,2 °C até 2050 e de 2,1 ºC até 2100. As informações mais pessimistas dão conta de que a elevação na temperatura pode atingir os 2,5 ºC até 2050 e 5,6º C até 2100. “Na Paraíba como um todo, é provável que ocorra o aumento na frequência de extremos climáticos, ou seja, períodos prolongados de forte seca intercalados por períodos curtos de chuvas muito intensas”, explica.

Brito afirma ainda que, em áreas específicas, o Litoral e a Zona da Mata paraibanos, poderá ocorrer um meio ambiente mais próximo do atualmente observado em Parnaíba e Teresina no Piauí. “No Brejo, há uma tendência de savanização; e aumento da aridez no Agreste, Cariri, Curimataú, Seridó e Sertão”, acredita. As principais razões para essas catástrofes climáticas, segundo o professor, são o aumento na atmosfera dos gases de efeito estufa e o desflorestamento. Com a terra mais quente, há previsão para o aumento no nível dos mares em média de 18 a 59 centímetros, o que vai afetar as cidades costeiras em vários continentes, de acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas). (JS)

Estudo prevê queda no PIB do Estado
Segundo previsões do estudo “Mudanças Climáticas, Migrações e Saúde:
Cenários para o Nordeste – 2000-2050”, o ritmo de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na Paraíba da região nordestina será o segundo com maior queda nos próximos 40 anos. Somente Pernambuco, com previsão de baixa de 18,6% supera a estimativa para as cidades paraibanas, que terão queda de até 17,7% na taxa de evolução do PIB. Em seguida, ficam Piauí (17,5%) e Ceará (16,4%).

Na projeção mais drástica, em 2050 o PIB dos municípios nordestinos vai ter uma redução de 15% ao que seria registrado se os efeitos do clima não fossem tão intensos. Na Paraíba, as cidades de Riachão e Itapororoca estarão em situação mais dramática do que todos os outros municípios da região Nordeste. O PIB dessas localidades deverá subir 48,8% e 48,3% menos do que aumentaria sem as mudanças climáticas. Orós, cidade do Ceará, teve o pior resultado com um crescimento menor em 47,6% do que seria registrado sem as modificações previstas.

Essas consequências surgem de outro grande problema causado pelas alterações nas temperaturas. Mais uma vez a Paraíba está no topo do cenário negativo observado pela análise dos estudiosos e aparece em terceira posição entre os Estados nordestinos que vão perder extensões de terras cultiváveis. A previsão é que o volume de retração chegue a 66,6%, no quadro mais pessimista, e 65,1%, considerando o cenário climático mais favorável. A estimativa aponta para uma diminuição drástica, com índices menores apenas do que no Ceará, com 79,6%, e Piauí, com 70,1%. Pernambuco é um dos Estados que terá o maior reflexo com 64,9%.

Nenhum comentário: