quinta-feira, 22 de julho de 2010

Pesquisa faz diagnóstico da pesca do camarão sete barbas no norte do estado

Débora Motta, da Agência Fapesp

A pesca marinha artesanal de camarões é uma das principais atividades econômicas do extremo norte do Rio de Janeiro. Das cinco espécies capturadas comercialmente no estado, o camarão sete barbas (Xiphopenaeus kroyeri) é a mais representativa, com volume de captura anual de cerca de 500 toneladas, segundo dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Pensando em estabelecer parâmetros para a exploração sustentável da espécie, a professora Ana Paula Madeira Di Beneditto, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), coordena um levantamento quantitativo e qualitativo da pesca do camarão sete barbas nos principais portos da região da costa norte fluminense.
Barcos pesqueiros da região: quantidade de siris e caranguejos
capturada acidentalmente é 2,6 vezes maior que a de camarões

        


Nesses portos – Barra do Itabapoana, Guaxindiba e Gargaú (município de São Francisco do Itabapoana), de Atafona (município de São João da Barra) –, a pesca camaroneira é monoespecífica, ou seja, direcionada apenas ao camarão sete barbas. Isso ocorre devido à abundância das populações naturais da espécie na região. “O camarão sete barbas não é criado em cativeiro, mas capturado artesanalmente no litoral norte do estado. Não é uma espécie nobre, tipo exportação, por ser considerado pequeno, com uma média de 12 centímetros, mas é a principal espécie destinada ao abastecimento do mercado Ceasa, no Rio, e do mercado São Pedro, em Niterói.”

De acordo com Ana Paula, apesar da importância econômica da espécie, poucos estudos foram realizados sobre o tema na região. “No norte do estado não havia pesquisas sobre esse estoque populacional de camarões com proposta de nortear a formação de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável”, diz a pesquisadora do Laboratório de Ciências Ambientais da Uenf. “Essa é uma demanda regional importante porque as áreas estudadas são essencialmente pesqueiras e agrícolas. Além disso, o estado é o maior produtor de pesca extrativa marinha da região sudeste.”

O estudo reúne informações adquiridas durante quatro anos de amostragens na região e vem sendo financiado pela FAPERJ ao longo desse período por meio dos programas APQ1, Jovem Cientista do Nosso Estado e Prioridade Rio. “O projeto tem como objetivo avaliar o estado de conservação desse estoque pesqueiro na região, contribuir para a compreensão do cenário da pesca camaroneira no extremo norte da costa do estado e gerar informações norteadoras de políticas públicas para o setor.”

A pesquisa identificou que a captura desse camarão é realizada na maioria das vezes de forma artesanal, com a rede de arrasto de fundo com portas, sendo que cerca de 30% a 40% do total de embarcações da região utiliza esse instrumento para a pesca. Para a professora, um dos maiores problemas é a captura acidental de outras espécies (rejeitos) durante a atividade de pesca. “O direcionamento dos rejeitos é o maior problema da pesca do camarão, já que para ele ser capturado, uma gama de espécies de siris, peixes e algas, além de outros organismos marinhos, costuma ser descartada”, avalia a bióloga. “Essa questão merece uma atenção especial não só do meio cientifico, mas de órgãos governamentais.”

Segundo a pesquisadora, as redes de arrasto – principal artefato utilizado tanto na pesca artesanal quanto na pesca industrial do camarão – são predatórias por definição. Elas têm malha pequena e baixa seletividade, ocasionando a captura de um elevado número de espécies ainda juvenis. “Além das espécies coletadas acidentalmente, que constituem os rejeitos da pesca, durante a operação, as redes também desestabilizam as comunidades bênticas, que são grupos de organismos que vivem no fundo do mar, como moluscos, poliquetas e algas.”

Captura acidental de outras espécies
Entre os produtos capturados acidentalmente a partir da pesca comercial do camarão sete barbas no norte fluminense, destacam-se várias espécies de peixes e crustáceos braquiúros (siris e caranguejos), com elevada representação quantitativa deste último grupo. O siri corre costa, Calinectes ornatus, é frequentemente capturado na região, onde é aproveitado como isca para outras modalidades pesqueiras. “A quantidade de siris e caranguejos capturada de modo acidental pela pesca camaroneira local pode chegar a 2,6 vezes a mais do que a quantidade de camarão capturada para fins comerciais”, ressalta.

Segundo Ana Paula, o fato merece atenção e monitoramento regular, pois indica a remoção de muitos indivíduos juvenis, que ainda não estão aptos a contribuir para a manutenção dos estoques populacionais da região. No entanto, os impactos da atividade pesqueira do camarão sete barbas ainda não prejudicam a sustentabilidade dessa população na região. “A atual taxa de exploração pela pesca ainda está abaixo da taxa máxima que a população local poderia suportar”, informa. “Também não foram encontrados indícios de efeitos negativos da poluição e a qualidade do camarão sete barbas é considerada boa.”

De acordo com o estudo, o litoral norte do estado é classificado como área de crescimento e reprodução do camarão sete barbas devido à presença de fêmeas e machos nos vários estágios de maturação sexual, durante todo o ano. A pesquisa também identificou o período de recrutamento da espécie em que há maior presença de juvenis (camarões que ainda não atingiram a fase adulta) na malha das amostras, que vai de dezembro a maio. Essa informação é importante para nortear as medidas de proteção (defeso) ao estoque pesqueiro. A atual política de defeso para o camarão sete barbas se baseia na Instrução Normativa Ibama n° 189/2008, que proíbe a pesca na região entre o período de 1º de março a 31 de maio. “Nesse sentido, a atual política de defeso atende à proteção dos juvenis de camarão sete barbas na região.”

A relação das comunidades pesqueiras com o meio ambiente local também foi levada em conta no projeto. De acordo com um levantamento do saber tradicional dos pescadores, a população ainda não estabelece uma relação direta entre o defeso e os camarões sete barbas juvenis, mas sim com a população de camarões como um todo ou mesmo com as fêmeas maturas. “O entendimento equivocado quanto ao objetivo do defeso como medida de proteção decorre, provavelmente, da falta de informação por parte da comunidade”, conclui.

Durante o trabalho de campo, são realizadas coletas marinhas mensais e acompanhamento da pesca em embarcações locais. As amostras de camarão sete barbas são analisadas posteriormente, no laboratório da universidade. Além da professora Ana Paula, participam do projeto uma equipe de dois alunos de pós-graduação da Uenf, um graduando em Biologia e uma bolsista de Treinamento e Capacitação Técnica (TCT 2) da FAPERJ.

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