Por Fábio de Castro, Agência FAPESP
Conseguir dados mais abundantes e precisos de forma mais rápida e eficiente é uma necessidade fundamental para o avanço de vários ramos das ciências ambientais. Exatamente por isso, as pesquisas relacionadas ao meio ambiente são também uma oportunidade para estimular o desenvolvimento da ciência computacional.
Esse foi o enfoque dado ao Workshop de Ciência Ambiental, promovido pelo Instituto Virtual de Pesquisas FAPESP-Microsoft Research na semana passada, na sede da Fundação.
O evento reuniu um grupo de pesquisadores do Brasil e do exterior com o objetivo de identificar problemas de pesquisa na área ambiental que possam ser enfrentados com o desenvolvimento de novas tecnologias computacionais. O encontro também foi o primeiro passo para o planejamento de um experimento multidisciplinar de pesquisas ambientais.
De acordo com Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, que abriu as discussões no último dia do workshop, os avanços no campo da e-science, ao aumentar a capacidade de processar dados e reunir competências, têm permitido realizações que não seriam possíveis em um passado recente.
“Essas oportunidades para grandes avanços científicos surgiram graças ao desenvolvimento de novos instrumentos, que permitem observar coisas menores, ou maiores, ou mais complexas ou mais distantes do que no passado”, disse.
Essa noção foi aplicada no âmbito da parceria entre FAPESP e Microsoft Research (MSR), em um projeto piloto realizado na Mata Atlântica que consistiu na instalação de uma rede de 50 sensores para coletar dados ambientais em grande escala. Trata-se da base para o desenvolvimento de um projeto que instalará sensores em vastas áreas da Amazônia, a fim de monitorar e compreender o funcionamento da floresta.
“Além disso, achamos que essa experiência abre caminho para outras possibilidades. Um dos desafios para desenvolver projetos de pesquisa e utilizar tais instrumentos consiste em reunir pesquisadores de áreas tão diferentes. Todos tendem, naturalmente, a querer fazer o que sempre fizeram muito bem em suas especialidades, por isso a cooperação não é algo trivial”, afirmou.
Para Brito Cruz, a ciência ambiental é um desses grandes campos nos quais existe a possibilidade de encontrar um terreno comum entre as várias especialidades científicas. “A floresta, em particular, parece ser um foco especialmente rico para essa interação”, disse.
Mas, além da floresta, segundo Brito Cruz, a FAPESP pode considerar também a extensão dessa colaboração científica para outros tipos de questões ambientais, como as emissões de carbono e de gases de efeito estufa.
“Há controvérsias, por exemplo, em relação à quantidade das emissões relacionadas à cana-de-açúcar. Os métodos para essas medições poderiam ser aprimorados e esse é certamente um campo em que a ciência se beneficiaria muito dessas novas capacidades computacionais. Há espaço para trazer algo interessante cientificamente e importante em termos de políticas relacionadas a biocombustíveis – um tema central para o Brasil”, disse.
Brito Cruz também destacou que, além do projeto em conjunto com a MSR, a FAPESP também tem importantes acordos com conselhos de pesquisa do Reino Unido para a área de ciência ambiental – entre eles o National Environment Research Council.
“Sabemos que a MSR também tem cientistas trabalhando no Reino Unido nessas áreas. Estamos avaliando como podemos estabelecer um diálogo entre todos esses projetos, a fim de unir interesses comuns e firmar colaborações”, afirmou.
Clima na Amazônia
Durante o workshop, Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e coordenador executivo do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), resumiu o estado atual das pesquisa sobre o clima na Amazônia, justificando a necessidade de desenvolver sensores de alta performance e baixo custo, a serem espalhados em larga escala na região.
De acordo com Nobre, o conjunto de estudos realizados na região amazônica até agora aponta que, se mais de 40% da floresta for desmatada, o sistema climático atingirá um tipping point, isto é, um ponto de saturação que tornaria a mudança ambiental irreversível, favorecendo a savanização do bioma.
Do ponto de vista do aquecimento global, os modelos indicam que o tipping point é um aumento médio da temperatura acima de 2º C. Para que a temperatura não ultrapasse essa média, estima-se que seja necessário manter as emissões de gases de efeito estufa no limite de 400 partes por milhão (ppm).
“O desmatamento no Brasil aumentou muito rapidamente até 2006, chegando a até 25 mil quilômetros quadrados por ano. Se esse ritmo continuar, até 2050 cerca de 50% da Amazônia estaria devastada, ultrapassando o tipping point e tornando impossível a recuperação do bioma”, indicou.
No entanto, segundo Nobre, as políticas públicas implementadas para deter o desmatamento parecem estar surtindo efeito. Desde 2006, a devastação começou a declinar e em 2009 caiu para 7 mil quilômetros quadrados.
“Se essa tendência persistir, o cenário em 2050 vai se manter abaixo do tipping point. As políticas para reduzir o desmatamento, que dependem do Brasil, aparentemente estão surtindo efeito nos últimos cinco anos. No entanto, a emissão de CO2 a partir de combustíveis fósseis continua subindo expressivamente – e o controle dessas emissões não depende das políticas brasileiras. Já atingimos o patamar dos 400 ppm e, se seguirmos nessa tendência, o tipping point será amplamente ultrapassado em breve”, explicou.
Segundo o cientista, nesse contexto será preciso desenvolver modelos climáticos brasileiros a fim de compreender com precisão a dinâmica climática na Amazônia e estabelecer medidas de mitigação. Para isso, o Inpe está instalando o supercomputador Tupã, adquirido com apoio da FAPESP e do Ministério da Ciência e Tecnologia.
O www.agencia.fapesp.br/materia/12874 equipamento – um sistema Cray com desempenho de 244 trilhões de operações de ponto flutuante por segundo – será o sexto computador mais poderoso do mundo aplicado às ciências do clima.
“O que precisamos agora, além de produzir o modelo brasileiro, é compreender os processos complexos envolvidos com a funcionalidade dos sistemas climáticos e biológicos da Amazônia. Para isso, será preciso espalhar, em vastas áreas, sensores capazes de trazer dados muito detalhados de forma muito eficiente”, disse.
Uma questão central, segundo Nobre, é de quantas espécies o ecossistema precisa para manter o nível adequado de transpiração e troca de gases com a atmosfera.
“Para ter essa resposta, teremos que monitorar individualmente cada espécie na floresta. No laboratório, podemos controlar um grande número de variáveis, mas fazer esse tipo de estudo na natureza é mais difícil. Precisaremos de uma grande rede de geossensores e biossensores”, afirmou.
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