terça-feira, 12 de maio de 2015

Espécie pouco conhecida de cigarra construtora motiva pesquisa no Amazonas

Por Fabrício Ângelo
Quem anda pelas matas da Amazônia já deve ter se deparado com pequenas estruturas feitas de areia, conhecidos popularmente como “chaminés”.
O que poucas pessoas sabem é que essas formações são construídas por larvas de uma espécie de cigarra encontrada apenas no sul dos Estados Unidos e no bioma amazônico, aFidicina chlorogena .
Convidado pelo Museu da Amazônia (Musa) o biólogo e pesquisador suíço, Dr. Claude François Béguin, conheceu esse tipo diferente de habitat e resolveu estudá-lo. Segundo Béguin, ainda se conhece pouco sobre a vida da Fidicina. “Algumas pessoas do Jardim Botânico de Manaus me falaram sobre essas estruturas diferentes e fiquei muito impressionado e resolvemos começar a pesquisar sobre elas”.
As chaminés também podem servir para manter os parâmetros físico-químicos de sobrevivência do inseto. Foto: Eduardo Gomes/CIÊNCIAemPAUTA
De acordo com o biólogo as “chaminés” são construídas pelos insetos ainda em sua fase de larva, mas ainda não se sabe exatamente qual a sua finalidade. “O que já descobrimos é que a estrutura é montada sobre galerias subterrâneas. Sabemos disso, pois, pudemos observar um inseto adulto rompendo a chaminé e saindo”, disse.
CICLO DE VIDA
As cigarras, como quase todos os insetos, vivem muito mais como larva do que na fase adulta. As espécies vivem abaixo do solo e depois de adultas se reproduzem nas copas das árvores, onde podemos ouvir o seu canto. “Antes de morrer as fêmeas depositam seus ovos nos galhos que caem sobre a terra e reiniciam o ciclo. A própria larva se enterra, sem ajuda”, explica o professor Claude.
Essas larvas se alimentam dos sulcos das raízes das árvores da floresta e ficam nesse estágio por dois ou três anos e é nesse tempo que as chaminés vão surgindo. “Uma coisa que nos impressionou muito é a profundidade dessa região subterrânea, quase um metro. Acreditamos que haja galerias ramificadas nesses locais”, afirmou.
Agora, a pesquisa entra na fase de avaliar como são construídas as estruturas, se por apenas uma cigarra ou por um grupo e se as galerias se comunicam.
Outra questão curiosa é entender como as chaminés crescem. “Passei o mês de novembro de 2013 no Jardim Botânico trabalhando com os insetos. Criei um sistema de marcas que medem altura e deslocamento da estrutura e com isso pude perceber que o segmento superior é que aumenta, isto é, a largura se mantém”, destacou o pesquisador.
De acordo com Claude François Béguin, o trabalho já conseguiu chegar a algumas conclusões, de como é feito o deslocamento e a reconstrução da estrutura. “Cortamos uma parte do topo de sete chaminés e esperamos para ver o que aconteceria, e a surpresa foi que a cigarras as fecharam pouco tempo depois. Não sabemos por que ela faz essa reparação, mas é incrível como tem essa habilidade”.
Aos poucos o professor Claude vai descobrindo mais informações sobre a espécie, seu modo de vida e essas estruturas. “Já me deparei com chaminés de 13 centímetros e que se mantêm fechadas e em pé. A cigarra realiza inúmeras idas e vindas do fundo do solo carregando areia para a construção e reparação das chaminés, o que faz com que elas sempre estejam alongadas e facilmente manuseáveis”, empolga-se.
PESQUISA DE ALTA PRECISÃO
Dr. Claude François Béguin. Foto: Eduardo Gomes/CIÊNCIAemPAUTA
     Dr. Claude François Béguin. 

Outra curiosidade citada pelo biólogo é que as chaminés também podem servir para manter os parâmetros físico-químicos de sobrevivência do inseto. “Elas dependem de algumas condições como temperatura, concentração de oxigênio, de gás carbônico, de umidade. E, provavelmente, isso é um dos motivos da rápida restauração da altura inicial de estrutura, pois a cigarra ao perceber esse desvio, se mobiliza para reconstruí-la”.
O professor Claude espera conseguir recursos para iniciar um trabalho minucioso de investigação, principalmente, por meio de sondas com microcâmeras. “Essa parte subterrânea é um mistério que precisamos desvendar para conhecer os ciclos de vida dessa espécie, assim como a função da estrutura”, enfatiza.
Além da Fidicina chlorogena, existe outra espécie de cigarra em um ponto diferente no Jardim Botânico. “Essas não fazem as chaminés, e seus poços subterrâneos não são profundos”, indica.
Ainda para o professor o tipo de solo em que vivem define o modelo de estrutura a ser criada. “O solo amarelo, onde estão as chaminés, é mais maleável e umidificável, o que ajuda na construção de estruturas e de regiões subterrâneas mais profundas”, falou.
A pesquisa ainda está em seus primeiros passos, até porque devido ao longo período de maturação da larva, é preciso estar sempre atento às modificações na estrutura. “Espero que outros pesquisadores se interessem pelo trabalho e deem continuidade, pois o pouco que sabemos já mostra que temos um novo e desafiador processo para se conhecer cada vez mais espécies desse bioma tão rico”, finalizou.
Fotos: Eduardo Gomes/CIÊNCIAemPAUTA

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