quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Furacões quentes

Quem sofre com as temperaturas elevadas no atual verão no Brasil pode se consolar em saber que a situação já foi muito pior. Imagine um El Niño que simplesmente não vai embora, não dando chances para a redução do calor durante muitos séculos?

Em artigo publicado na edição desta quinta-feira (25/2) da revista Nature, pesquisadores da Universidade Yale e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos, apontam um motivo para as temperaturas elevadas de 3 milhões a 5 milhões de anos atrás, durante o início do período Plioceno.

Uma dúvida que intrigava os cientistas era como o calor se manteve durante tanto tempo, uma vez que as concentrações de dióxido de carbono eram semelhantes às atuais.

Segundo o estudo, o motivo foram os ciclones tropicais (ou furacões) mais frequentes no Pacífico, que alteraram a distribuição de água quente no Equador, levando a uma espécie de El Niño muito duradouro. O resultado foi uma temperatura média cerca de 4º C mais elevada do que a atual.

Alexey Fedorov, de Yale, e colegas combinaram um modelo de estudos de furacões com modelos climáticos para investigar a época que muitos pesquisadores consideram a mais próxima das condições que se esperam no futuro próximo com relação à emissão de gases de efeito estufa.

O grupo identificou uma relação entre furacões e a circulação nas camadas superiores do oceano. Massas de água foram aquecidas pelos ciclones à medida que se dirigiam ao Equador e, depois, subiram no Pacífico equatorial leste como parte da circulação oceânica promovida pelas correntes de ar.

De acordo com a pesquisa, ciclones tropicais eram mais frequentes no Pacífico Central, área em que atualmente há poucos furacões. E essa grande atividade provavelmente fortaleceu o aquecimento do Pacífico equatorial leste o que, por sua vez, aumentou ainda mais a frequência de furacões.

A relação entre furacões e circulação oceânica pode levar a múltiplos estados climáticos, apontam os pesquisadores. Um deles, ocorrido no início do Plioceno, foi o de condições de El Ninõ milenar. Outro estado é o atual, de um Pacífico equatorial leste mais frio.

Segundo os autores, os resultados da pesquisa reforçam o papel importante dos ciclones tropicais no clima do planeta.

O artigo Tropical cyclones and permanent El Niño in the early Pliocene epoch (Vol 463
doi:10.1038/nature08831) de Alexey Fedorov e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em www.nature.com.

Mais soro contra aranhas

Por Alex Sander Alcântara, da Agência Câmara

A aranha-marrom (gênero Loxosceles) é pequena (cerca de 1 centímetro de comprimento) e pouco agressiva. Suas picadas ocorrem geralmente como forma de defesa, quando entram inadvertidamente em roupas ou calçados, por exemplo. Apesar disso, está longe de ser inofensiva.

No ato da picada, na maioria das vezes não há dor. Mas depois de cerca de 12 horas ocorre um inchaço na região afetada e febre. Com o avanço, e sem tratamento, o veneno pode causar necrose do tecido atingido, falência renal e até mesmo morte.

De acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, em 2009 foram registrados 85.718 casos de acidentes com animais peçonhentos no Brasil, dos quais 17.474 com aranhas. Dos acidentes com aranhas, os casos envolvendo espécies de aranha-marrom responderam por um terço (5.728) do total.

O Butantan produz um soro para picadas de aranha-marrom, mas há considerável dificuldade para se obter o veneno usado na produção. “Como as aranhas são pequenas, o que se consegue de veneno é pouco. São necessárias centenas de exemplares para se produzir o soro”, disse Denise Vilarinho Tambourgi, diretora técnica do Laboratório de Imunoquímica do Instituto Butantan, à Agência FAPESP.

Pesquisadores do instituto acabam de dar um importante passo para tentar diminuir o problema, ao isolar o gene responsável pela fabricação da toxina esfingomielinase D, principal componente tóxico do veneno da aranha-marrom.

Estudos conduzidos desde 1997 no Butantan haviam conseguido avançar na decifração dos principais componentes do veneno e como ele atua no organismo infectado. Agora, a equipe do Laboratório de Imunoquímica conseguiu inserir um gene da aranha em Escherichia coli, desenvolvendo um processo para a produção, em larga escala, da esfingomielinase D, por meio da bactéria – e não da própria aranha. A novidade poderá facilitar a produção do soro antiloxoscélico, empregado contra o veneno de aranha-marrom.

“Vários resultados mostram que o veneno da aranha-marrom tem um componente central, a esfingomileinase D, responsável pelos principais sintomas clínicos. Com base nisso, conseguimos isolar e introduzir o gene que codifica para essa toxina em bactéria. Para outros venenos, tal processo talvez não seja aplicável, uma vez que os venenos animais são, em geral, misturas complexas contendo várias toxinas, responsáveis pelos sintomas clínicos apresentados nos diferentes envenenamentos”, disse Denise, que atualmente também desenvolve o projeto “Erucismo decorrente do contato com lagartas de Premolis semirufa (Lepidotera, Arctiidae)”, que tem apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.

Os soros utilizados atualmente neutralizam as toxinas em circulação no organismo humano, mas não são muito eficazes para tratar lesões na pele – o veneno da aranha-marrom causa, na maioria dos casos, lesão local. “Essa lesão é de difícil resolução e pode levar meses para cicatrizar. Em alguns casos, os pacientes chegam a precisar de implantes”, apontou.

Como a picada da aranha-marrom é indolor e a reação local não se manifesta imediatamente, as vítimas só procuram ajuda quando a lesão na pele está instalada. “A necrose dos tecidos não é mais uma consequência do veneno, mas de uma cascata de reações do próprio organismo, acionadas pelas esfingomielinases D”, explicou Denise.

Fora a lesão local, há também a possibilidade de o paciente desenvolver um quadro sistêmico, que acomete um número menor de pacientes, mas que quando ocorre pode ser extremamente grave, levando inclusive à morte.

“O indivíduo pode ter hemólise intravascular e, em casos muito graves, isso pode causar danos renais e, em última instância, o óbito. Mas os quadros variam de acordo com a espécie e idade de aranha, local da picada ou se foi macho ou fêmea. Há ainda as características da vítima, como características genéticas e nutricionais ou idade. Tudo isso influencia”, disse.

As três espécies de aranhas-marrons (L. gaucho, L. intermedia, L. laeta) estão bem adaptadas ao cenário intradomiciliar. A L. gaucho é mais comum em São Paulo, enquanto as outras duas ocorrem mais no Sul do país, no Paraná e em Santa Catarina, respectivamente. O soro produzido utilizando as esfingomielinases D obtidas por meio da E. coli é eficaz contra o veneno das três espécies.

Testes em humanos
Após isolar o gene responsável pela produção da toxina esfingomielinase D, os pesquisadores do Butantan inseriram anéis de DNA (plasmídeos) com o gene da aranha em bactérias Escherichia coli, que começaram a produzir a toxina.

A esfingomielinase D foi inicialmente administrada em camundongos e coelhos, para a produção de anticorpos que serviriam como matéria-prima do soro. Em seguida, os testes foram feitos em cavalos.

“Isolamos os anticorpos produzidos pelo animal para a produção do soro. Em seguida, comparamos esse soro experimental com o que se utiliza na terapêutica humana e vimos que tal soro era capaz de neutralizar o veneno total”, disse Denise.

No novo processo as bactérias substituem as aranhas para a obtenção das toxinas. Os pesquisadores clonaram, na E. coli, os genes responsáveis pela toxina de duas das espécies de aranha-marrom: a L. intermedia, comum no Paraná, onde ocorre a maior parte dos acidentes no país, e a L. laeta, mais venenosa e presente em vários países latino-americanos.

A próxima etapa da pesquisa é o teste do soro em humanos. Para isso, será necessário produzir três lotes consecutivos de soro antiloxoscélico. “Para a última fase, o ensaio clínico, precisaremos da autorização da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]. Nossa expectativa é que até o fim do ano esses três lotes de soro estejam prontos”, disse.

Um dos estudos relacionados à aranha-marrom e realizado no âmbito do projeto coordenado por Denise é o de Daniel Manzoni de Almeida, intitulado “Análise do potencial neutralizante de um novo soro antiloxoscélico produzido contra esfingomielinases recombinantes dos venenos de aranhas Loxosceles e que teve apoio da FAPESP na modalidade Bolsa de Mestrado.

Saudades do jornalismo ambiental

Por Marcos Sá Correa

O Brasil precisa criar oficialmente um novo premio de jornalismo ambiental. Para entregá-lo, postumamente, pelo conjunto da obra, aos autores e meios de comunicação que fizeram do assunto, na década de 1930, a viga mestra de um projeto para o país, pretendendo, ao mesmo tempo, defender seu patrimônio natural, acertar o passo da população mais pobre e marginalizada com a fartura original da exuberância nativa e reordenar o Estado brasileiro de maneira a torná-lo, nas raízes, essencialmente nacional.

Não foi à-toa que aqueles anos desembocaram, em 1934, na Primeira Conferência Brasileira de Proteção à Natureza. E, pouco mais tarde, na decretação dos primeiros parques nacionais do Brasil – poucos, pequenos e retardatários, mas pioneiros, em Itatiaia, na Serra dos Órgãos e no Iguaçu.

Depois, como veio, a onda passou, tragada pelos maremotos políticos da Segunda Guerra Mundial e da redemocratização. Ficou esquecida por tanto tempo, que agora parece nova em folha em “Proteção à Natureza e Identidade Nacional no Brasil, ano 1920-1940”. O livro dos professores José Luiz de Andrade Franco e José Augusto Drummond parece uma cartilha das coisas que, por desmemoriado, o jornalismo brasileiro anda reaprendendo ultimamente, como se fossem lições inéditas do século XXI.

Isso numa terra onde, há mais de 70 anos, o zoólogo Cândido de Mello Leitão fazia no rádio um programa chamado “A Vida Maravilhosa dos Animais”, cravejado de citações científicas, para contar como já era antiga, naquele tempo, a corrida internacional para remediar, com reservas naturais e legislação ambiental, os estragos deixados pelas “realizações humanas interesseiras”.

Mello Leitão tinha sérias dúvidas sobre os parques que o Brasil acabara de instalar. Itatiaia “não passava de “uma pequena reserva florestal”, de valor “quase nulo” para a preservação da fauna, por estar encarapitado em grimpas que nem os cafezais do Vale do Paraíba ousaram escalar. O da Serra dos Órgãos poderia no máximo poupar “por algum tempo a flora”. Mas, “quanto à fauna, será um deserto sem expressão”.

O do Iguaçu, sim, tinha porte e vocação para servir de santuário, por exemplo, a “guarás e lontras”, se “as construções que se fazem sem audiência de um zoólogo” não sinalizassem a intenção de reduzi-lo a “um simples parque de turismo paisagista”. Tudo o que ele disse na época circula na boca dos funcionários e pesquisadores hoje às voltas com a caduquice ambiental desses parques nacionais septuagenários.

Aquela geração sabia o que estava dizendo. O médico convertido em botânico Alberto José Sampaio tinha um programa completo para substituir o modelo tradicional de progresso via desmatamento por uma civilização de “cidades-jardins”, cercadas de matas submetidas a normas severas de manejo e silvicultura.

O escultor Armando Magalhães Corrêa, que acabou morando num sítio em Jacarepaguá, publicou em série no Correio da Manhã, como se fossem parte de um folhetim, as histórias reunidas em “O Sertão Carioca”. Seu livro é o último inventário de tudo o que a cidade perdeu. E ele tinha seu próprio plano conservá-la. Mas andam difíceis de encontrar não só o Rio que ele viu como o livro em que o retratou. Ainda bem que Franco e Drummund se encarregaram de fazer essa garimpagem inadiável.

Fonte: htpp://www.marcossacorrea.com.br

Ambientalistas se unem contra alterações no Código Florestal

Por Geórgia Moraes, da Rádio Câmara

A Frente Parlamentar Ambientalista discute estratégias para evitar alterações no Código Florestal (Lei 4.771/65). Os parlamentares se reuniram nesta quarta-feira com entidades de defesa do meio ambiente para discutir o assunto. Eles são contrários às propostas que estão sendo discutidas por uma comissão especial na Câmara e temem que o parecer do relator, deputado Aldo Rebelo (PcdoB-SP), represente um retrocesso na legislação do setor.

os deputados da frente criticaram o seminário realizado ontem sobre o tema, por ter ouvido apenas entidades e parlamentares favoráveis a mudanças na lei. Os parlamentares alegam que entidades como WWF, Greenpeace, SOS Mata Atlântica, Preserva Amazônia e Conservation International, entre outras, também querem ser ouvidas.

Visão unilateral
O deputado Ricardo Trípoli (PSDB-SP) disse que a discussão sobre o Código Florestal não pode ser submetida exclusivamente à opinião dos ruralistas. "Até onde eu sei, a proposta daqueles que participaram da reunião de ontem é contrária ao Código Florestal. Eu acho que há uma resistência muito grande. Estamos longe de uma negociação possível. Há uma distância enorme entre as propostas que estão sendo colocadas e o que se projeta para esse relatório", disse.

O deputado Ivan Valente (Psol-SP) defende o atual Código Florestal e argumenta que a discussão deveria se concentrar no modelo agrícola do País e na função da propriedade fundiária. "Essa mudança do Código Florestal é um atentado contra toda a legislação ambiental brasileira. Não é um debate ideológico. Eles estão numa ofensiva muito grande para detonar todo o acúmulo da legislação ambiental brasileira e rigorosamente estão mexendo em toda a legislação", afirmou.

O deputado Sarney Filho, coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, acredita que o relatório de Aldo Rebelo vai flexibilizar as regras para a reserva legal e as áreas de proteção permanente, o que seria um processo.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Brasil é o 2° país que mais usa transgênicos, diz agência

O Brasil ultrapassou a Argentina em 2009 e se tornou o segundo país que mais utiliza produtos agrícolas geneticamente modificados no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, informou nesta terça-feira o Serviço Internacional para Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA, em inglês), órgão que acompanha a adoção de produtos transgênicos no mundo.

O presidente da ISAAA, Clive James, disse que o Brasil plantou no ano passado 21,4 milhões de hectares com produtos transgênicos, 100 mil hectares a mais do que a Argentina. Os EUA lideram com folga a adoção de produtos alterados geneticamente, com 64 milhões de hectares.

A soja domina o cultivo de transgênicos no Brasil e Argentina, mas o crescimento do uso de lavouras geneticamente modificadas no Brasil no ano passado foi liderado pelo milho. Dos 21,4 milhões de hectares semeados no Brasil, 16,2 milhões de hectares foram plantados com soja transgênica.

Fonte: Terra

Mineração climática

Por Fábio Reynol, da Agência Fapesp

Um dos principais desafios das pesquisas em meteorologia é a enorme quantidade de dados envolvida. Por conta disso, uma equipe do Departamento de Ciências de Computação do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos (SP), pretende aperfeiçoar as ferramentas atuais utilizadas na área por meio de técnicas de mineração de dados.

O “AgroDataMine – Desenvolvimento de métodos e técnicas de mineração de dados para apoiar pesquisas em mudanças climáticas com ênfase em agrometeorologia”, coordenado pela professora Agma Juci Machado Traina, foi selecionado em chamada e tem apoio do Instituto Microsoft Research-FAPESP de Pesquisas em Tecnologia da Informação. Iniciado em dezembro de 2009, deve ser concluído em novembro de 2011.

O grupo pretende direcionar os avanços obtidos pelo projeto em aplicações na agricultura, especialmente em culturas de café e da cana-de-açúcar. Para isso, a USP-São Carlos trabalhará com a Embrapa Informática Agropecuária (unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), com o Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) da Universidade Estadual de Campinas. Também participarão pesquisadores da Universidade Federal do ABC e da Universidade Federal de São Carlos.

Em meio a dados complexos, apresentados em volumes medidos em terabytes (trilhões de bytes), um dos maiores desafios é selecionar as informações relevantes. Um dos focos da equipe está nos extremos climáticos, eventos severos que têm aumentado em número e em intensidade nos últimos anos (como por exemplo em 2009), de acordo com dados históricos.

“Vamos procurar fazer a previsão dos extremos climáticos aprimorando os modelos atuais de análise atmosférica”, disse Agma à Agência FAPESP.

Para isso, sua equipe deverá lançar mão de métodos como o da teoria de fractais e da modelagem do caos. “A teoria de fractais é especialmente eficaz para verificar a similaridade de partes em relação ao todo de um objeto estudado. Geralmente, os extremos climáticos rompem um padrão, portanto detectar exceções em um sistema pode ajudar a indicar esses eventos”, disse.

A diretora do Cepagri, Ana Maria Heuminski Ávila, esclarece que os aprimoramentos desenvolvidos no projeto serão testados em dados já coletados. “Vamos utilizar registros históricos, coletados por satélites e estações meteorológicas, e comparar os resultados obtidos pelo modelo com o clima registrado posteriormente”, apontou. Essa verificação pode ajudar a aumentar a precisão de cada modelo em traçar cenários futuros.

Impacto na agricultura
Segundo Ana Maria, a melhoria das ferramentas atuais de tecnologia da informação impactará diretamente na agricultura, uma vez que será possível traçar com antecedência cenários climáticos que indiquem áreas mais ou menos sujeitas a determinados eventos.

Como exemplo, cita o grande volume de chuvas ocorrido nos últimos meses. “A cana-de-açúcar necessita de um período de estiagem, do contrário a planta fica com teor menor de açúcar, afetando a produção”, disse.

Por outro lado, a planta é tolerante às ondas de calor, diferentemente do café que, com temperaturas acima de 32º C, pode sofrer abortamento das flores, o que prejudica a sua reprodução. Detectar previamente onde ocorrerão ondas de calor ou frio, por exemplo, seria importante para o sucesso dessas culturas.

Segundo Luciana Alvim Santos Romani, pesquisadora da Embrapa Informática Agropecuária e que também participa do AgroDataMine, vários obstáculos técnicos terão de ser transpostos nesse projeto. “Temos dados de dois satélites que contam com resoluções diferentes. Precisamos descobrir como trabalhar com essas diferenças”, disse.

Outro desafio, segundo ela, é a interação entre profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Fazem parte do projeto meteorologistas, engenheiros agrônomos, cientistas da computação, matemáticos, entre outros especialistas.

Apesar disso, Luciana considera a interdisciplinaridade também um estimulante. “O importante é que toda a equipe está muito motivada e estamos caminhando muito bem, cada um desenvolvendo a sua área”, afirma.

Microsoft Research-FAPESP
O Instituto Microsoft Research-FAPESP de Pesquisas em TI é uma iniciativa para apoiar projetos de pesquisa em tecnologias de informação e comunicação propostos por pesquisadores associados a universidades e institutos de pesquisa no Estado de São Paulo.

O objetivo é formar uma rede de pesquisadores capazes de criar novos conhecimentos que contribuam para expandir as capacidades da tecnologia de computação para atender desafios sociais e econômicos de comunidades desfavorecidas, rurais e urbanas.

Na mais recente chamada lançada pelo Instituto Microsoft Research-FAPESP (Chamada 06/2009), na qual o projeto AgroDataMine foi aprovado, o objetivo foi apoiar propostas que explorariam a aplicação da ciência da computação a desafios da pesquisa fundamental em áreas como educação, saúde e bem-estar, energia e ciências do meio ambiente.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Venenos de interesse

Por Fábio de Castro, da Agência Fapesp

Reunindo o trabalho de mais de 120 cientistas de 20 países, o livro Animal Toxins: state of the art. Perspectives in health and biotechnology, que acaba de ser lançado, tem o objetivo de sintetizar o conhecimento internacional acumulado nos últimos anos sobre toxinas encontradas em animais marinhos, artrópodes e serpentes – além de catalogar suas mais novas aplicações em medicina e biotecnologia.

A editora-chefe do livro, Maria Elena de Lima – presidente da Sociedade Brasileira de Toxinologia (SBTx) e professora do Departamento de Bioquímica e Imunologia, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que a importância da biodiversidade brasileira justifica que a obra, de alcance internacional, tenha sido publicada por aqui (pela Editora UFMG).

“Os produtos animais derivados dessas substâncias biologicamente ativas são focos atuais da ciência na busca de novos medicamentos e aplicações em biotecnologia. Como o Brasil possui cerca de 25% da biodiversidade mundial, sentimos a obrigação de liderar essa iniciativa”, disse Maria Elena à Agência FAPESP.

Além de Maria Elena, outros quatro pesquisadores se encarregaram da edição da obra: Adriano Monteiro de Castro Pimenta, também professor do ICB-UFMG, Russolina Benedeta Zingali, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e os franceses Marie France Martin-Eauclaire e Hervé Rochat, pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Científica.

A equipe selecionou os autores entre aqueles que haviam dado contribuições mais relevantes à toxinologia animal nos últimos anos. O resultado foram 750 páginas divididas em 39 capítulos, com contribuição de mais de 120 cientistas que trabalham com diferentes aspectos da toxinologia em 20 países.

O papel de destaque do Brasil no cenário internacional da pesquisa em toxinologia, segundo Maria Elena, não se deve somente à imensa biodiversidade. A tradição dos estudos na área remonta aos trabalhos de Vital Brazil (1865-1950).

Entre os autores que contribuíram com o livro há cientistas de instituições com grande histórico de pesquisas na área, incluindo o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Além do Instituto Butantan, pioneiro em toxinologia no país, participaram também pesquisadores de instituições paulistas como a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“Uma evidência de que o Brasil tem excelência na área é que na revista Toxicon, uma das principais da área, temos vários editores brasileiros e calcula-se que até 30% das publicações são provenientes do país”, afirmou.

A professora acredita que atualmente os pesquisadores da área de toxinologia estão recebendo incentivo satisfatório no Brasil. “Isso é importante porque está relacionado à defesa do nosso material biológico, que é bastante raro e cobiçado. Queremos decifrar as possibilidades existentes nessas substâncias a fim de nos tornarmos proprietários delas”, disse.

Para garantir o domínio do conhecimento na área, segundo Maria Elena, é preciso capacitar recursos humanos especializados. A obra também deverá dar sua contribuição nesse aspecto. “O livro é voltado para cientistas, mas também para estudantes de todos os níveis, em áreas como biologia, farmácia, biotecnologia e biomédicas e biológicas em geral”, apontou.

Segundo ela, havia carência, no meio científico, de uma obra abrangente que reunisse resultados de pesquisas e possibilidades de aplicações em saúde e biotecnologia.

“Antes, as moléculas de interesse extraídas das toxinas animais eram usadas apenas em tratamentos de problemas de saúde. Hoje elas já são bastante utilizadas em experimentos para estudar, por exemplo, funções do sistema nervoso e cascatas de coagulação. Portanto, as toxinas podem ser usadas como ferramentas”, explicou.

Outra vertente atual, segundo Maria Elena, consiste em procurar conhecer o efeito biológico das toxinas para entender como elas interferem em funções do organismo perdidas ou exacerbadas. “Podemos usar essas moléculas como modelos de fármacos, como foi o caso do captopril, medicamento para hipertensão que teve base em uma toxina do veneno de jararacas”, disse.

O laboratório coordenado por Maria Elena na UFMG, por exemplo, isolou uma molécula com funções anti-hipertensivas, isolada do veneno do escorpião. “Essa molécula, no entanto, age por mecanismos distintos daquela extraída da toxina da jararaca e poderá resultar em um medicamento alternativo para os pacientes nos quais o captopril não faz efeito”, disse.

* Animal Toxins: state of the art. Perspectives in health and biotechnology

Editores: Maria Elena de Lima e outros

Lançamento: 2010

Preço: R$ 205

Mais informações: www.editoraufmg.com.br

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Programa LBA procura diretor científico

Da Agência FAPESP

O Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia (LBA) está selecionando um diretor científico. O candidato escolhido iniciará suas atividades a partir do dia 1º de abril e será contratado por quatro anos, com possibilidade de renovação. As inscrições poderão ser feitas até o dia 15 de março.

O profissional contratado trabalhará alocado no escritório central do Programa LBA, no campus do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) em Manaus (AM). Ele irá coordenar e implementar a estratégia científica geral do Programa LBA, além de monitorar a execução de todos os projetos aprovados.

O diretor científico terá a missão de propor um plano de trabalho que deverá ser revisado pelo comitê científico e aprovado pelo conselho do programa. O profissional também coordenará questões relacionadas a recursos financeiros e articulará institucionalmente as cooperações nacionais e internacionais.

Outra missão para o candidato selecionado será supervisionar o uso das bases de dados do Projeto LBA e apoiar o estabelecimento de novos projetos e articulações nacionais e internacionais com equipes científicas.


Os candidatos deverão ter doutorado, experiência no gerenciamento de projetos interdisciplinares e experiência de atuação mínima de cinco anos como pesquisador, após o doutorado, ou em posição de coordenação de projetos.

Deverão ainda possuir experiência em pesquisa na Amazônia com ênfase na agenda científica do Projeto LBA, além de proficiência verbal e escrita em inglês, português e espanhol. O trabalho exige dedicação em tempo integral, disponibilidade para morar em Manaus e viajar pelo Brasil e pelo exterior.

Mais informações: isabel.vega@inpa.gov.br

Memória da imprensa

Por Alex Sander Alcântara, da Agência Fapesp

Há décadas a historiografia contemporânea tem incorporado a imprensa como fonte fundamental para se compreender momentos históricos e a atuação de protagonistas. Mas a fragilidade e as limitações do papel impresso, especialmente seu acesso, representam dificuldades aos pesquisadores.

Com o objetivo de ampliar o acesso a jornais e revistas do século 19 e início do século 20 no Brasil, o Arquivo Público do Estado de São Paulo acaba de lançar o site Memória da Imprensa, uma seleção de periódicos digitalizados do acervo da instituição.

O serviço reúne por enquanto 14 títulos de jornais e revistas de época, que permitem acompanhar a trajetória da imprensa paulista e brasileira a partir da seleção de exemplares de 1854 a 1981.

De acordo com o Carlos de Almeida Prado Bacellar, coordenador do Arquivo Público, além de ampliar o acesso, outro objetivo importante do novo site é preservar os raros originais das publicações.

“Jornais e revistas antigos têm um suporte muito delicado. O papel amarela com facilidade e a consulta é muito complicada. O acesso direto aos originais ajuda a destruir ainda mais. Quanto mais conseguirmos passar para o formato digital, mais colaboraremos na preservação dos originais”, disse à Agência FAPESP .

Segundo ele, a partir de agora pesquisadores não terão acesso aos originais dos jornais e revistas que já estão em formato digital. “Só poderão consultar em casos muito específicos e que serão analisados. Essa é uma iniciativa importante para preservar o acervo”, disse.

Parte do acervo já digitalizado ajuda a reconstituir momentos importantes dos mais de 200 anos de história da imprensa no Brasil. Pesquisadores já podem acessar desde publicações que marcaram época, como a revista A Cigarra (1914-1975) e o jornal Última Hora (1951-1971), até títulos menos conhecidos, como o jornal sindical Notícias Gráficas (1945-1964) e o anarquista La Barricata (1912-1913).

Segundo Bacellar, a ideia é colocar à disposição do público um conjunto variado de fontes. “Buscamos alguns exemplos de periódicos famosos, mas que ilustrem tendências ou conceitos diferentes. Temos desde a grande imprensa até pequenos jornais e revistas com perfis mais variados, como sindicais, políticos ou culturais”, disse.

A digitalização dos jornais e revistas é uma iniciativa interna do Arquivo do Estado. “Algumas digitalizações em curso estão envolvidas diretamente em projetos de pesquisa relacionados, como, por exemplo, à imigração em São Paulo, e à resistência política durante a Ditadura Militar”, explicou.

Movimento

O Memória da Imprensa já soma mais de 1.670 páginas de jornais, mas, de acordo com seu coordenador, as páginas disponíveis ainda representam uma amostra ínfima, se comparadas com a totalidade disponível no Arquivo do Estado.

“Esperamos que esse material sirva para o uso do professor em sala de aula e dos próprios alunos. Caso o professor queira dar uma aula sobre o período da República Velha no Brasil pode, por exemplo, consultar alguns jornais anarquistas do período”, disse.

Um dos destaques é o periódico alternativo Movimento, que liderou a campanha pela anistia durante a ditadura militar. Lançado em 1975 e fechado em 1981, teve 3.093 artigos e 3.162 ilustrações censurados pela ditadura.

Segundo Bacellar, a alimentação do site será feita ao longo do ano de forma aleatória, com relação aos títulos. “Mas, às vezes, coincide com solicitação externa. Uma entidade pede, por exemplo a digitalização de um determinado jornal. De qualquer forma, pretendemos chegar, até o fim do ano, com mais de 2 milhões de páginas digitalizadas”, disse.

O Arquivo Público do Estado de São Paulo é um dos maiores arquivos públicos brasileiros. Sua hemeroteca tem cerca de 1,2 mil títulos e 32 mil exemplares de revistas e mais de 200 títulos de jornais.

Já estão disponíveis no site as revistas O Malho (1902-1954), Panóplia (1901-1935), Anauê! (1935), Vida Moderna (1907-1925) e Escrita (1975-1988), além dos jornais Lanterna (1901-1935), Acção (1936), Germinal (1902-1913) e Correio Paulistano (1854-1963), este último o primeiro diário da província de São Paulo.

Para acessar a página e mais informações: http://www.arquivoestado.sp.gov.br/memoria

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Parque une produção de energia e materiais alternativos para visitação pública

Vinicius Zepeda, da Faperj

Energia extraída dos ventos e de raios solares, biodiesel, reutilização de água da chuva e de poço após tratamento, uma casa demonstrativa feita de materiais ambientalmente corretos e com tratamento próprio natural de esgoto. Estas são algumas das atrações do Parque de Energias Alternativas (PEA) da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf).

Situado na cidade de Campos dos Goytacazes e aberto à visitação de estudantes, pesquisadores e demais interessados, o PEA é uma iniciativa do Núcleo de Energias Alternativas (Neal) da Uenf, que reúne em torno de 25 pesquisadores lotados em quatro laboratórios, além de representantes de outros setores da universidade. Coordenado pelo meteorologista e pesquisador da Uenf Valdo da Silva Marques, ao longo de pouco mais de três anos de existência, o espaço tem contado com o constante apoio da FAPERJ por meio de projetos de divulgação e de extensão universitária e também por projetos desenvolvidos por cientistas ligados ao tema do parque.

Implantado com recursos da Usina Termoelétrica Termo Rio S.A., o projeto foi instalado em área de 2.500 metros quadrados e conta com uma edificação demonstrativa de 130 metros quadrados; uma unidade de armazenamento, controle e distribuição de energia; seis aerogeradores de 1,0 kw cada um; e 24 painéis solares, capazes de produzir 3,6 kw de energia. "O projeto tem ajudado bastante na conscientização, principalmente dos jovens, sobre a necessidade de adoção de tecnologias limpas, principalmente energia eólica (dos ventos), solar e biocombustíveis. Além disso, diversos pesquisadores da Uenf têm direcionado suas pesquisas visando desenvolver metodologias para melhorar o aproveitamento de energias renováveis, como o etanol, as células de combustíveis a energia solar e a eólica", explica Valdo Marques.

O meteorologista e coordenador do PEA explica algumas das pesquisas sobre temas relacionados ao parque. "No Laboratório de Meteorologia da Uenf, em Macaé, estamos desenvolvendo um aerogerador para produzir entre 6 e 10 kW de energia que será usada num sistema de extração de água subterrânea até uma profundidade de 100 metros. Já no Laboratório de Química, está sendo realizada uma pesquisa para melhorar a desempenho de células de combustíveis, para produzir energia a partir do hidrogênio", afirma Marques.

Ele complementa a explicação com os estudos feitos no Laboratório de Materiais Avançados (Lamav). "Ali buscamos aprimorar os painéis solares e o uso de leguminosas, como o girassol, e óleos graxos de origem animal para a produção de biodiesel. Todos esses projetos têm apoio técnico-científico do Núcleo de Energias Alternativas da Uenf.", acrescenta.

O parque da Uenf conta com um sistema híbrido de energia eólica e solar de cerca de 8kW de energia, capaz de abastecer uma residência com lâmpadas eficientes e equipamentos eletrodomésticos, como geladeira, televisão, microcomputador, forno microondas, ferro de passar. Porém, ele não é recomendado para acionar aparelhos de ar-condicionado, pois ainda não produz energia suficiente. "Além disso, o sistema de aquecimento de água é altamente eficiente para suportar um boiler de até 400 litros", afirma Valdo Marques.

A residência citada pelo coordenador do PEA, a chamada casa demonstrativa, possui um mini-auditório, secretaria, sala de monitoramento, cozinha e banheiro. Praticamente todo o material utilizado na construção é alternativo: tijolo solo-cimento, fabricado sem necessidade de ir ao forno, telha sem amianto, piso feito com aproveitamento de resíduos industriais, forro produzido com aproveitamento de material reciclado, madeira certificada, argamassa fabricada a partir de resíduos industriais, entre outros materiais.

As instalações contam ainda com um sistema de recolhimento de água da chuva, usado para a irrigação. O tratamento de efluentes sanitários inclui um sistema de biofiltro e biofossa, considerados ecologicamente corretos. "Com esses materiais pode-se construir uma casa com baixa emissão de carbono, além de aproveitar produtos naturais e o mecanismo da reciclagem, sem agredir a natureza", complementa.

Além disso, ele destaca a importância do projeto para a pesquisa. "O PEA abre um leque de oportunidades de estudos na área de energias renováveis, técnicas inovadoras, novos materiais e sistemas de aproveitamento de energia limpa", complementa. Por último, ele destaca a expansão do projeto, que em breve deverá ganhar uma área para a construção de um prédio para abrigar a produção de biodiesel.

"Isso já está em análise pela prefeitura do campus da Uenf. Este novo espaço empregará como matéria-prima plantas oleaginosas, como o girassol, e também o óleo usado em atividades domésticas", conclui.

Os interessados em agendar visitas individuais ou em grupo ao Parque de Energias Alternativas podem telefonar para (22) 2739-7348. Grupos de alunos sempre deverão levar um responsável. Para solicitar uma explanação ou palestra é preciso avisar no momento da marcação da visita. A gestora do parque, Margareth Gomes Barreto está sempre à disposição para mais informações.

Pesquisar para exportar

Por Fábio de Castro, da Agência Fapesp
A Agência Norte-Americana de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) anunciou que o etanol brasileiro de cana-de-açúcar reduz as emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 61% em relação à gasolina – o que o caracteriza como um “biocombustível avançado”.

O reconhecimento da EPA – que abre o mercado norte-americano e mundial para o etanol brasileiro e deverá contribuir para a redução das tarifas de importação impostas ao produto pelo governo dos Estados Unidos – aumenta ainda mais a necessidade de investimentos em pesquisas relacionadas ao biocombustível no Brasil, segundo pesquisadores.

“O governo dos Estados Unidos reconheceu algo que já estava bem claro para a comunidade científica. Trata-se de uma excelente notícia para o etanol brasileiro, pois a disponibilidade de um biocombustível avançado comercialmente viável é um elemento importante para a estratégia norte-americana de redução de emissões de GEE [gases de efeito estufa]. No entanto, a provável abertura do mercado criará uma demanda que só poderá ser suprida se tivermos um grande avanço tecnológico”, disse Luís Augusto Barbosa Cortez, professor titular da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), à Agência FAPESP

Segundo Cortez, a necessidade de aumento da produção poderá ter tal magnitude que somente seria possível de ser realizada com investimentos em pesquisa para o aprimoramento do etanol de primeira geração e para o desenvolvimento da produção de etanol celulósico – que deverá aumentar a produtividade sem expansão da área plantada de cana-de-açúcar.

“Essa boa notícia precisa ser acompanhada de investimentos para que o etanol tenha melhores indicadores, como custo de produção, redução de consumo de fertilizantes, produtividade agroindustrial, condições de trabalho no campo e redução de queimadas. A sustentabilidade do etanol tem que ser considerada em suas dimensões ambientais, sociais e econômicas”, disse.

Cortez, que é coordenador adjunto de Programas Especiais da FAPESP, coordena o Projeto de Pesquisa em Políticas Públicas da Cadeia Cana-Etanol (Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo), apoiado pela Fundação e voltado para as rotas tecnológicas para a produção do etanol.

De acordo com avaliação feita pela União da Indústria de Cana-deAçúcar (Unica), a decisão da EPA abre o mercado para a entrada de 15 bilhões a 40 bilhões de litros de etanol brasileiro nos Estados Unidos até 2022. A nova legislação norte-americana estabelece que o consumo mínimo de biocombustíveis deve ser de mais de 45 bilhões de litros anuais e, até 2022, esse volume deverá ser elevado para até 136 bilhões de litros.

“A decisão não abre o mercado apenas nos Estados Unidos, mas em todo o mundo, porque a EPA é reconhecida em todos os países e o etanol brasileiro provavelmente ganhará importância nas estratégias de redução de emissões de todos eles”, disse Cortez.

O pesquisador também coordena estudos sobre expansão da produção de etanol no Brasil visando à substituição de 10% da gasolina no mundo em 2025 por etanol de cana-de-açúcar, feitos pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) e pelo Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe), da Unicamp.

Para ser considerado um biocombustível avançado, o produto deve reduzir as emissões de GEE em pelo menos 40% em relação à gasolina. Artigos científicos indicaram que a redução do etanol brasileiro variava entre 60% e 90%, dependendo da metodologia de estudo. O etanol de milho norte-americano, em comparação, produz redução de cerca de 15%.

“Que eu saiba, por esse critério, não há nenhum outro biocombustível avançado comercialmente viável. O biodiesel europeu, que tem melhor desempenho, proporciona reduções na faixa de 20% a 30%. Os norte-americanos têm esperanças de conseguir essa classificação para o etanol de segunda geração, mas ele ainda não é comercial e quando estiver sendo produzido ainda será muito caro”, afirmou Cortez.

Aumento da produção
O professor da Feagri-Unicamp explica que o reconhecimento da EPA certamente ajudará a derrubar a tarifa de importação do etanol brasileiro nos Estados Unidos, que está estabelecida até o fim de 2010 em US$ 0,54 por galão.

A tarifa, estabelecida para proteger os produtores de etanol de milho nos Estados Unidos, é considerada um grande obstáculo para o produto brasileiro. Mas, segundo o cientista, o ideal é que elas sejam diminuídas gradativamente, com a criação de tarifas diferenciadas.

“Com essas tarifas eles protegem os fazendeiros, mas não reduzem as emissões o suficiente. Esse protecionismo é incoerente com as estratégias ambientais e deverá ser revisto. Mas é preciso que essa redução aconteça paulatinamente para que a indústria brasileira tenha tempo para se preparar para a imensa demanda que será gerada. Se a redução for repentina, isso poderá levar ao desabastecimento”, disse.

O reconhecimento da EPA do etanol brasileiro como biocombustível avançado não basta para que ele seja integrado à estratégia norte-americana, segundo Cortez.

“Para optar de fato pelo nosso etanol, eles precisarão analisar se o Brasil é um fornecedor seguro. O único jeito de garantir isso é aumentar a produção. Hoje, sabemos que uma simples alta na exportação do açúcar já é capaz de afetar o fornecimento de etanol no Brasil”, afirmou.

Cortez ressalta que hoje os Estados Unidos consomem cerca de 560 bilhões de litros de etanol por ano, enquanto o Brasil consome aproximadamente 40 milhões de litros.

“Se o mercado norte-americano começar a demandar uma quantidade importante como 5 ou 10 bilhões de litros por ano, isso vai afetar significativamente o mercado brasileiro. Esse mercado é muito sensível ao preço do açúcar em nível internacional e ao consumo de álcool em nível interno”, destacou.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Mico leão dourado é ferramenta para preservar a biodiversidade do São João

Débora Motta, da Agência Faperj

    
   
O mico leão dourado (Leontopithecus rosalia) é um símbolo da luta pela preservação das espécies brasileiras ameaçadas de extinção. No norte fluminense, um projeto aposta na preservação do pequeno primata de pelos alaranjados e cauda longa como instrumento para conservar outras espécies que vivem na Área de Proteção Ambiental da bacia do rio São João e para promover o desenvolvimento sustentável local. Essa bacia hidrográfica abriga quase toda a população de micos leões dourados que ainda existem na natureza e também é a principal fonte de abastecimento de água de importantes municípios da Região dos Lagos, como Cabo Frio e Arraial do Cabo.

De acordo com o coordenador do estudo e professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), Carlos Ramon Ruiz-Miranda, o mico leão dourado é considerado uma “espécie bandeira” para a conservação da Mata Atlântica, vegetação predominante na bacia hidrográfica do rio São João e de inigualável biodiversidade. “Ao protegermos o mico leão dourado, estaremos favorecendo todas as outras espécies da região. Isso porque ele reúne características ecológicas de espécies de vários grupos, entre elas alimentação diversificada, com insetos, frutas e pequenos vertebrados, e necessidade de diversos habitats para viver, como encostas e baixadas”, explica.

Criado em 1983, o projeto utiliza uma abordagem ecossistêmica, isto é, leva em conta a preservação global – da terra, da água, da flora e da fauna. A proposta é consolidar a paisagem florestal, aumentando o número de áreas protegidas e a conectividade entre elas, para tornar viável a existência das populações de micos leões dourados e de inúmeras outras espécies. “Estamos usando o mico como ferramenta para olhar essa paisagem, o que envolve análises demográficas e pesquisas genéticas com os animais, estratégias de reflorestamento – especialmente das matas ciliares, para preservar o rio –, educação ambiental comunitária e criação de corredores ecológicos”, aponta o biólogo.

Os micos estão atualmente distribuídos em uma paisagem muito fragmentada da Mata Atlântica – o segundo ecossistema florestal mais ameaçado do planeta. As populações estão espalhadas por duas reservas biológicas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a da União e a Poço das Antas, e em 28 reservas particulares ou fazendas, todas localizadas na bacia do rio São João – a região é uma Área de Proteção Ambiental (APA) federal chamada de São João/Mico Leão Dourado. Eles formam uma “metapopulação” de cerca de 1.600 micos para 13 mil hectares. “Os animais não vivem todos juntos em uma comunidade. É como se habitassem em diferentes ‘bairros’, separados entre si e de diferentes tamanhos. No estudo demográfico, temos uma estimativa da população de cada ‘bairro’. O conjunto das populações desses ‘bairros’ é chamado de metapopulação”, explica.

Daí a importância do manejo da metapopulação pelos cientistas. Boa parte das populações de micos leões dourados foi reintroduzida na natureza pelos pesquisadores, especialmente na década de 1990 (originalmente eram de cativeiro e, aos poucos, foram cruzando com os poucos micos selvagens que habitavam a região). Outros animais foram translocados (viviam isolados em determinada área e foram removidos para outra, com o objetivo de evitar a extinção).

Carlos destaca que nenhuma população tem capacidade de viver a longo prazo se for manejada individualmente, pois populações pequenas e isoladas são vulneráveis à extinção. “O futuro do mico leão dourado depende da preservação das florestas numa paisagem interconectada, que permita manejar os micos e o habitat dentro de um modelo de metapopulação”, assinala o biólogo, ressalvando que é necessário avaliar o DNA dos animais antes de decidir pela translocação, para evitar uma baixa variabilidade genética. Os estudos de genética são realizados na própria Uenf, pela pós-doutoranda Adriana Daudt Grativol, e a modelagem de viabilidade genética é feita em conjunto com colaboradores do National Zoo e University of Maryland. “Utilizamos a técnica de PHVA (Análise de Viabilidade de Populações e Habitat)”, diz Carlos.

Os micos leões dourados evitam caminhar em áreas desmatadas, como os pastos. Para estimular a conexão entre eles nesses locais, o projeto – coordenado até recentemente por Ana Maria Godoy e Rosan Fernandez, da AMLD – tem criado corredores ecológicos. “Eles funcionam como pontes de vegetação replantada por cima do pasto de propriedades rurais particulares, que ligam duas florestas. Para o replantio, utilizamos de 40 a 50 espécies de mudas e a participação dos proprietários rurais tem sido chave para a conservação do mico e recuperação das florestas”, conta Carlos, destacando a viabilidade econômica dos corredores, além da ecológica. “Pode ser interessante para que esses corredores tenham produtividade, então estamos experimentando, entre as espécies escolhidas para o replantio, o eucalipto”.

cargo do doutorando em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf Marcio Morais, que modela estratégias para o manejo desses invasores. Já a doutoranda Daniela Sampaio estuda o processo de caça na região. O desmatamento na APA hoje é raro, de porte pequeno, e está fiscalizado pela ICMBio”, pondera.

A meta até 2025 é fazer com que os micos leões dourados cheguem a um número mínimo de dois mil para 25 mil hectares de florestas protegidas e interconectadas. “Quando começamos o projeto, só existiam 300 micos leões dourados na bacia hidrográfica do rio São João. Hoje, temos cinco vezes mais micos e muito mais área verde”, avalia. “Até recentemente, ele era ‘criticamente ameaçado’ de extinção, estando entre os dez primatas mais ameaçados do mundo. Hoje, diminuímos uma categoria. Agora não é mais uma ameaça de extinção crítica, é só de extinção”, completa.

O projeto, que recebeu apoio da FAPERJ por meio do edital Pensa Rio, é resultado de uma colaboração entre a Uenf, a Associação Mico Leão Dourado (AMLD), a Área de Proteção Ambiental da bacia do rio São João, a Reserva Biológica União, a Reserva Biológica Poço das Antas, o Ministério do Meio Ambiente, a Petrobras e pesquisadores de diversas instituições estrangeiras, como o Smithsonian Institution/National Zoological Park, University of Maryland e o Great Ape Trust of Iowa, todos dos Estados Unidos.

A equipe conta com a participação de 30 cientistas. Entre eles, estão: Adriana Grativol, da Uenf, Marcelo Trindade Nascimento, da Uenf, Dora Villela, da Uenf, Maria Cristina Gaglianone, da Uenf, James Dietz, da Universidade de Maryland, Denise Rambaldi, da AMLD, Ana Maria Godoy, da AMLD, Patrícia Mie, da AMLD, Andréia Martins, da AMLD, Jennifer Mickleberg, do National Zoological Park, Marcio Marcelo de Morais, doutorando em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf, Daniela Sampaio, doutoranda em Ecologia e Recursos Naturais da Uenf e Valeria Romano de Paula, aluna de iniciação científica da Uenf, além de vários outros alunos e pesquisadores. 





Mosquitos na mira

Para milhões nos países tropicais que correm risco de contrair malária, uma boa notícia vem de um estudo feito nos Estados Unidos e publicado na edição desta quinta-feira (4/2) da revista Nature.

O artigo, de pesquisadores das universidades Yale e Vanderbilt, descreve a descoberta de mais de duas dúzias de receptores em mosquitos transmissores da malária que atuam na detecção do suor humano. Segundo os autores, a descoberta pode ajudar no desenvolvimento de novas formas de combater a doença, que mata cerca de 1 milhão de pessoas anualmente.

O motivo é que os receptores olfativos do Anopheles gambiae oferecem novos alvos potenciais para repelir, confundir ou atrair o mosquito para armadilhas.

“O mundo precisa desesperadamente de novas maneiras para controlar esses mosquitos que se mostrem eficientes, baratas e não prejudiciais ao meio ambiente. Alguns desses receptores podem se tornar alvos excelentes para o controle do comportamento desses mosquitos”, disse John Carlson, professor em Yale e líder da pesquisa.

Embora se saiba há tempos que os mosquitos são atraídos pelos odores corporais humanos, como o sistema olfatório dos mosquitos detecta esses diferentes elementos químicos é algo desconhecido.

“Os mosquitos nos encontram pelo olfato, mas pouco sabemos como isso ocorre. Aqui nos Estados Unidos os mosquitos são fonte de irritação, mas em grande parte do mundo eles são fontes de morte”, disse Carlson.

O cientista identificou os primeiros receptores de odores em insetos em 1999, em pesquisa com a mosca-da-fruta (Drosophila). Seu grupo, então, descobriu uma maneira engenhosa de usar esse inseto para estudar como funciona o sistema olfatório do mosquito.

Os pesquisadores produziram moscas geneticamente modificadas sem receptores de odores. Em seguida, ativaram genes de 72 receptores olfativos do anófeles em células de drosófilas que não tinham esses receptores.

As moscas resultantes foram expostas a diversos tipos de odores e as respostas relacionadas a cada receptor foram analisadas. Durante a pesquisa, foram registrados mais de 27 mil respostas, que foram reunidas em uma biblioteca de odores.

Os cientistas observaram respostas particularmente fortes em 27 receptores, a maioria dos quais respondia a componentes químicos encontrados no suor humano.

“Agora estamos pesquisando componentes que interajam com esses receptores. Compostos que confundam esses receptores, por exemplo, podem ser usados para diminuir a capacidade de o mosquito encontrar o homem. Ou compostos que os estimulem podem atrair os insetos para armadilhas”, disse Carlson.

O artigo Odorant reception in the malaria mosquito Anopheles gambiae, de John Carlson e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em http://www.nature.com/.

Fonte: Agência Fapesp

MPF recomenda tamponamento de esgotos lançados ao mar

O Ministério Público Federal (MPF) em Alagoas expediu nesta quarta-feira (03 de fevereiro) recomendação à Secretária Municipal de Proteção ao Meio Ambiente de Maceió (SEMPMA) para que o órgão realize o tamponamento dos esgotos lançados ao mar através de ligações clandestinas na rede de captação de águas pluviais. De autoria da procuradora da República Niedja Kaspary, a recomendação é resultado de um procedimento administrativo instaurado na Procuradoria da República em Alagoas (PR/AL) que apurou o lançamento de esgotos por prédios comerciais e residenciais na orla marítima da cidade.

No ano passado, o MPF requisitou informações à secretaria quanto a persistência do lançamento de esgoto por condomínios e particulares. Caso constatasse a situação, o órgão deveria coibir imediatamente a irregularidade, realizando o tamponamento dos esgotos ou o bombeamento do material para a rede coletora. No entanto, segundo a recomendação, os empreendimentos continuam jogando clandestinamente o esgoto no mar.

Conforme se apurou no procedimento administrativo instaurado, que culminou com a presente recomendação, as ligações irregulares de esgotos à rede de galerias pluviais são as principais causadoras das chamadas “línguas negras” nas praias. “Esgotos a céu aberto, ligações clandestinas em redes pluviais e lançamento de dejetos, sem qualquer tipo de tratamento, diretamente em águas correntes, riachos e no mar das praias de Maceió são fatos do cotidiano de nossa população”, assevera Niedja Kaspary.

A informação reforçada por notícias recentemente publicadas na imprensa local, segundo apurou o MPF. Um problema que, de acordo com a procuradora da República, “afeta não só o meio ambiente mas também – e principalmente – a população da capital alagoana”. Na recomendação, Kaspary lembra ainda que a ação ou omissão que viole regras jurídicas de proteção do meio ambiente é considerada infração administrativa, segundo o previsto na Lei dos Crimes Ambientais ( 9.605/98).

Fundamentação 
Entre os fundamentos legais para a recomendação, a procuradora também considera que a SEMPMA deve seguir o Código Municipal de Meio Ambiente de Maceió, que proíbe o lançamento de esgoto, mesmo tratado, nas praias ou na rede de águas pluviais. Também foram tomados por base a lei nº 3.538/85 (Código de Posturas do Município de Maceió), que proíbe o lançamento de águas servidas nos logradouros públicos e prevê, como destino delas, a rede pública de esgoto e o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, que estabelece prioridade na conservação de praias e restingas.

Um dos órgãos envolvidos com o projeto Mar Aberto, que visa coibir o lançamento indevido de esgotos nas galerias pluviais, a SEMPMA terá o prazo de 10 dias para se manifestar sobre o acatamento da recomendação. Mesmo não sendo obrigatório o cumprimento da recomendação, seu descumprimento pode acarretar por parte do MPF/AL, o ajuizamento de ações judiciais contra a pessoa jurídica ou física responsável, com repercussões civis, administrativas e criminais.

Fonte: Procuradoria da República em Alagoas

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Lagartos do Vale do Peruaçu

Por Fábio Reynol, da Agência Fapesp

Ao acompanhar um amigo em uma viagem ao Vale do Peruaçu, região norte de Minas Gerais, o biólogo Mauro Teixeira Júnior teve uma grande surpresa. Ele avistou um lagarto Enyalius pictus, espécie que até então os especialistas só haviam encontrado na região da Mata Atlântica.

O episódio levou Teixeira a elaborar um projeto de mestrado com o objetivo de fazer um levantamento dos lagartos do Vale do Peruaçu. Sob a orientação do professor Miguel Trefaut Urbano Rodrigues, do Departamento de Zoologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), o biólogo começou seu trabalho em 2007 com apoio de uma Bolsa da FAPESP, no âmbito de um Auxílio à Pesquisa – Regular coordenado por Rodrigues.

Dois anos depois, o trabalho de Teixeira resultou em um levantamento inédito sobre as espécies de lagartos encontradas durante a pesquisa, além de seus hábitos alimentares, relações com o clima, períodos de reprodução, entre outros dados relevantes.

Para coletar exemplares, o biólogo visitou o local durante os períodos de inverno (seco) e de verão (chuvoso) nos anos de 2008 e 2009 e espalhou armadilhas pela vegetação. Grupos de quatro baldes foram enterrados dispostos em formato de “Y” com uma lona preta ao redor. Os animais, ao tentar contornar a lona, caíam nos baldes.

Com esse sistema, chamado de armadilha de interceptação e queda, Teixeira recolheu informações valiosas sobre a fauna da chamada mata seca, bioma caracterizado por florestas sobre solo calcário que perdem a folha durante o período anual de estiagem.

Uma espécie de lagarto, a Stenocercus quinarius, considerada rara até então, foi encontrada em abundância no Vale do Peruaçu. “Só no primeiro dia de coleta, capturamos 20 lagartos dessa espécie”, disse Teixeira, informando que na literatura especializada só havia registros de oito exemplares avistados.

O conhecimento sobre os hábitos das espécies também foi aperfeiçoado com a pesquisa. Lagartos do gênero Phylopezus, considerados pela literatura como de hábitos noturnos, foram encontrados ao sol. E exemplares do gênero Mabuya, que os pesquisadores acreditavam ser terrícula (que só vive no solo), foram encontrados sobre árvores.

Para traçar o trajeto desses animais, o biólogo amarrou uma linha no dorso de exemplares capturados e os libertou. “Encontramos linhas passando sobre árvores, o que indicou que os Mabuya sobem na vegetação”, disse. Segundo ele, o sistema locomotor desse grupo não parece adaptado para escalar as plantas, o que torna a descoberta mais intrigante.

Nova espécie

O lagarto da Mata Atlântica que levou Teixeira a iniciar sua pesquisa, o Enyalius, mereceu uma atenção maior. Como os exemplares do norte de Minas apresentaram algumas diferenças morfológicas em relação aos da vegetação litorânea, o biólogo pretende agora fazer um exame de DNA para comparar os grupos. “Caso haja diferenças significativas no DNA, poderemos ter encontrado uma nova espécie”, disse.

Outra novidade que o estudo trouxe está relacionada aos hábitos reprodutivos dos lagartos. Apesar de a maioria das espécies se reproduzir no período chuvoso, foram encontradas algumas que se reproduzem o ano todo e ainda outras que preferem o período seco para esse fim, contrariando a hipótese inicial de que as condições extremas impostas pela estiagem impediriam a reprodução.

Além de lagartos, as armadilhas do projeto capturaram sapos e cobras. Entre eles, foi descoberta uma nova espécie de sapo. Teixeira quer aproveitar os dados de incidência desses outros animais para escrever um artigo sobre a herpetofauna (anfíbios e répteis) do Vale do Peruaçu.

Estudos como esse são muito importantes, segundo o orientador da pesquisa, pois tratam de uma região muito pouco conhecida e estudada. “Não sabemos praticamente nada desses pequenos biomas de transição”, disse Rodrigues, para quem essas áreas têm sido devastadas em vários pontos do país sem que ninguém se dê conta.

O professor da USP espera agora que Teixeira amplie esse trabalho em um projeto de doutorado, mapeando e coletando espécies da herpetofauna de matas secas de outras regiões do Brasil.

Mudanças climáticas invadem tribunais nos EUA

Por Fabiano Ávila do Portal CarbonoBrasil

Processos contra grandes emissores de gases do efeito estufa começam a surgir por todos os Estados Unidos e no meio de incertezas jurídicas e científicas fica a sensação que basta um deles vencer para que aconteça uma mudança na postura do país

Os Estados Unidos são famosos por seus motivos inusitados para processos milionários, do cidadão que processa a prefeitura por ter tropeçado na calçada ao vizinho que processa o amigo porque o cachorro deste fez as necessidades no seu quintal. Mas agora parece que esta cultura assumiu uma maior seriedade e pode trazer um beneficio inesperado: frear as mudanças climáticas.

A vila esquimó de Kivalina foi motivo de uma extensa reportagem no New York Times recentemente por entrar com um processo contra mais de 20 empresas, incluindo a Exxon e a Shell, no qual pede que as companhias paguem pelos custos de transportar toda a vila da ilha onde está localizada para o continente, uma manobra que pode custar US$ 400 milhões.

O motivo disto seria o aquecimento global, que está pondo em risco a existência da vila. Blocos de gelo costumavam se formar no inverno e defendiam Kivalina dos fortes ventos e das poderosas ondas do Ártico. Mas esses blocos não estão mais se formando e a própria ilha está sofrendo um sério problema de erosão.

“Estamos em janeiro e o gelo não formou. Vivemos em grande ansiedade durante as estações dos fortes ventos”, afirmou Janet Michel, administradora de Kivalina, ao New York Times.

Este é só um dos muitos processos envolvendo mudanças climáticas em andamento nos EUA. O Center for Biological Diversity na última semana entrou com sete ações contra o Departamento de Florestas da Califórnia por causa da aprovação do desmatamento de áreas sem terem sido realizados os estudos necessários para analisar as emissões de carbono e outras conseqüências climáticas deste ato.

“Ao dar continuidade ao desmatamento, o Departamento está criando um enorme buraco na credibilidade da política climática da Califórnia”, afirmou Brian Nowicki, diretor do Center for Biological Diversity.

Legislação

A falta de leis claras para o assunto deixa os tribunais e advogados em uma situação precária, ficando difícil tanto defender quanto acusar. De um lado existem as provas de que algo realmente está alterando o clima em Kivalina, por exemplo, mas não há como ligar isso às gigantes de petróleo e nem ao menos se pode responsabilizar o aquecimento global com certeza cientifica.

A conselheira para energia e mudanças climáticas da administração Obama, Carol M. Browner, acredita que a criação da legislação climática seria a melhor coisa para essas batalhas jurídicas e reconhece que elas estão servindo para colocar mais pressão para que o Congresso aprove as novas leis que estão emperradas no Senado.

A transformação das cortes americanas em campos de batalha sobre o clima ainda não é uma realidade, mas se nada for feito para regular a situação as conseqüências podem ser sérias, acredita Harold Kim, que trabalhou na administração Bush e agora é vice presidente da United States Chamber Institute for Legal Reform.

“É uma tendência que pode se tornar explosiva, para o bem ou para o mal, dependendo de como você olha”, disse Kim ao New York Times.

Em um relatório em 2009, a seguradora Swiss Re comparou os processos envolvendo as mudanças climáticas com os movidos anos atrás contra a indústria de amianto, que acabaram por levar diversas empresas a falência.

Já para Michael B. Gerrard, diretor do Center for Climate Change Law da Universidade de Columbia, as ações contra empresas que afetam o clima lembram os primeiros processos contra a indústria do tabaco, que resultaram em uma série de limitações e novas regulamentações.

Sem uma base sólida para fazer suas acusações, o advogado do caso Kivalina, Stephen D. Susman, assumiu que o processo é muito complicado. “O cenário legal é horrível”, disse.

Por esse mesmo motivo ele acredita que o caso não deve servir de precedente para a criação de milhares de ações caça-níqueis ao redor dos Estados Unidos. “Nenhum advogado pode dizer que isto é um jeito fácil de ganhar dinheiro”, concluiu Susman.