Redução da emissão de gases do efeito estufa ainda não é suficiente para cumprir metas do protocolo
A redução de 5,2% na emissão de gases do efeito estufa, estabelecida pelo Protocolo de Quioto para o período de 2008 a 2012, ainda é um grande desafio para os principais países industrializados. Quinze anos após a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio-92), uma das maiores já organizadas com o intuito de discutir a ameaça das mudanças climáticas, especialistas concluem que, apesar de muitos acordos terem sido feitos, ainda é preciso pôr em prática muitas medidas para que as metas de redução nas emissões comecem a ser cumpridas. Para especialistas reunidos na Conferência Rio+15, a falha das promessas de redução das emissões presentes no Protocolo do Quioto deve-se à falta de transferência de capitais e investimentos para cobrir os custos dessas metas. Dezenas de autoridades e representantes de instituições da área ambiental e econômica de todo o mundo, reunidas na semana passada na conferência Rio+15, acreditam que a falha das promessas de redução do Protocolo do Quioto deve-se à falta de transferência de capitais e investimentos para cobrir os custos que essas metas implicam, além do ceticismo diante da real gravidade da situação. Por outro lado, o tratado prevê meios para flexibilizar essas metas, como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que incentiva os países em desenvolvimento a crescer de forma sustentável.
Com o MDL, é possível que empresas de países industrializados obtenham créditos de carbono por meio da redução de emissões promovida por projetos de outros países financiados por elas. As chamadas Reduções Certificadas de Emissões (RCEs) podem ser usadas para alcançar as próprias metas de compromisso de redução ou ser negociadas no mercado de carbono. Para a engenheira Suzana Kahn, pesquisadora da Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e secretária do meio ambiente do estado do Rio de Janeiro, o Protocolo de Quioto foi um sucesso em MDL. “Estamos subestimando o impacto do tratado. Hoje, há uma moda, uma tendência a fazer investimentos em tecnologias limpas, o chamado Cleantec”, avalia ela, que também é membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. E completa: “Quioto criou um apetite para projetos verdes no mercado de capitais.” No entanto, segundo o vice-secretário do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Neilton da Silva, o processo de “mercantilização” do carbono tira o foco do Protocolo de Quioto, que devia estar concentrado somente na redução de emissões e no desenvolvimento sustentável. "Quioto, criado objetivamente para reduzir emissões, se mercantilizou de um jeito que o volume financeiro se tornou o atrativo.”
O papel das nações em desenvolvimento A exigência de que países em desenvolvimento com grandes índices de emissão de gases de efeito estufa cumpram as metas do protocolo é umas das maiores discussões atuais. O Brasil, por exemplo, é um dos cinco países do mundo com maior taxa de emissões, devido aos grandes incêndios para desmatamentos e à industrialização crescente. “Acredito que o Brasil deva integrar o movimento, mas não aceitar compromissos que prejudiquem seu crescimento econômico”, diz Marc Stuart, um dos co-fundadores da Ecosecurities, empresa que negocia créditos de carbono e organizou a Rio+15. “Os países em desenvolvimento também têm que assumir as emissões de gases de efeito estufa, mas os maiores compromissos têm que ser assumidos pelos países ricos.” Para Alfredo Sirkis, um dos fundadores do Partido Verde e ex-secretário do meio ambiente do Rio de Janeiro, o país tem condições de arcar com as metas estabelecidas. "Se é verdade que o Brasil realizou grandes avanços para reduzir o desmatamento na Amazônia, não entendo por que não assume um compromisso para reduzir as emissões”, comenta. Após 2012, as estimativas são de que, em dez anos, seja necessário reduzir até 20% das emissões de gases de efeito estufa, o que aumentará a corrida para soluções mais efetivas.
Para Fernando Almeida, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, o mundo precisa de liderança para enfrentar esse quadro. “Temos líderes em quantidade e qualidade para esse desafio? Temos o Mandela do aquecimento global?”, polemiza Almeida, que acredita que é necessário um pacto entre as principais empresas, como a Shell, a Alcoa, a Petrobrás e a Aracruz, além de organizações como o Greenpeace e a WWF para se chegar ao fim do desmatamento no Brasil. A contribuição das empresas A busca pelo equilíbrio entre proteção ambiental e desenvolvimento econômico depende diretamente de investimentos em eficiência energética, pois esse segmento representa a melhor opção de custo para reduzir as emissões, segundo o chefe do Departamento de Meio Ambiente da Eletrobrás, Sérgio Barbosa de Almeida. “A energia produzida pelas hidrelétricas é uma fonte limpa, que gera mais impacto sócio-econômico do que contribuições ao efeito estufa. Mas a empresa não está paralisada, estamos em busca de fontes alternativas”, esclarece Almeida.
O setor de aviação é apontado como um dos maiores entraves na luta contra as emissões de gases do efeito estufa. Para alcançar mudanças efetivas no setor industrial, é importante que o governo e o setor privado assumam juntos a responsabilidade. Mas até que ponto o MDL pode ser benéfico para as indústrias? Manoel Frade, representante da Philips na América Latina, defende que soluções tecnológicas que economizem energia são essenciais para gerar resultado sem comprometer o meio ambiente. “Al Gore sempre disse: ‘troque a lâmpada’. Trocar uma lâmpada incandescente por uma fluorescente, por mais que esta seja mais cara, faz a economia de luz chegar a 80%”, ressalta Frade. Um dos maiores obstáculos na luta contra as emissões de gases do efeito estufa ainda é o setor de aviação. “A quantidade de emissões da aviação comercial, que desempenha papel vital no desenvolvimento econômico, equivale a 2% do total dos gases do efeito estufa emitidos. O valor é representativo, mas se equipara ao da indústria automobilística”, afirma o vice-presidente da Empresa Brasileira de Aeronáutica, Henrique Rzezinski. E acrescenta: “Já temos um avião agrícola que voa com motor a álcool e estamos investindo muito em pesquisas para que os níveis de ruído e de emissões nocivas sejam reduzidos.”
Segundo os participantes do evento, reduções significativas nas emissões de gases de efeito estufa em nível global requerem comprometimento político, alocação de capital para financiar mudanças na infra-estrutura da economia e cooperação de todos os países emissores para alcançar os padrões exigidos. “Talvez a solução mais imediata de todas seja a participação voluntária, como as iniciativas de ONGs, para a conscientização da população”, conclui Virgílio Viana, secretário do meio ambiente do estado do Amazonas.